ONU alerta que ciclo mundial da água está se tornando cada vez mais imprevisível; entenda consequências

Inundações e secas cada vez mais intensas são um “sinal de socorro” do que está por vir, à medida que as mudanças climáticas tornam o ciclo da água do planeta cada vez mais imprevisível, alertou a Organização das Nações Unidas (ONU) nesta segunda-feira. No ano passado, os rios do mundo seu ponto de maior secura em mais de 30 anos, as geleiras sofreram a maior perda de massa de gelo em meio século e também houve um número “significativo” de inundações, disse a Organização Meteorológica Mundial da ONU em um relatório.

“A água é o canário na mina de carvão das mudanças climáticas”, disse a secretária-geral da OMM, Celeste Saulo, em uma declaração que acompanha o relatório sobre o Estado dos Recursos Hídricos Globais. “Recebemos sinais de socorro na forma de chuvas cada vez mais extremas, inundações e secas que causam um grande impacto em vidas, ecossistemas e economias”, disse ela.

Celeste disse que o aquecimento da atmosfera da Terra tornou o ciclo da água “mais errático e imprevisível”. O ano passado foi o mais quente já registrado, com altas temperaturas e condições secas generalizadas, produzindo secas prolongadas. Também houve muitas inundações ao redor do mundo.

Esses eventos extremos foram influenciados em parte por condições climáticas naturais, incluindo os fenômenos climáticos La Niña e El Niño, mas também, e cada vez mais, por mudanças climáticas induzidas pelo homem.

“Uma atmosfera mais quente retém mais umidade, o que é propício para chuvas pesadas. Evaporação mais rápida e secagem dos solos pioram as condições de seca”, disse Celeste.

Derretimento maciço de geleiras

A água é abundante ou insuficiente, colocando muitos países em situações cada vez mais difíceis. No ano passado, a África foi o continente mais impactado em termos de vítimas humanas. Na Líbia, duas barragens romperam devido a uma grande enchente em setembro de 2023, matando mais de 11 mil pessoas e afetando 22% da população, de acordo com a OMM.

As inundações também atingiram o Grande Chifre da África, a República Democrática do Congo, Ruanda, Moçambique e Malawi. Atualmente, 3,6 bilhões de pessoas têm acesso insuficiente à água doce pelo menos uma vez por mês por ano, de acordo com a ONU. Espera-se que esse número aumente para mais de cinco bilhões até 2050.

Nos últimos três anos, mais de 50% das bacias hidrográficas ficaram mais secas do que o normal. Enquanto isso, o fluxo para os reservatórios ficou abaixo do normal em muitas partes do mundo na última meia década.

O aumento das temperaturas também significa que as geleiras derreteram em taxas sem precedentes, perdendo mais de 600 bilhões de toneladas de água, o pior em 50 anos de observações, de acordo com dados preliminares de setembro de 2022 a agosto de 2023.

“O derretimento do gelo e das geleiras ameaça a segurança hídrica de longo prazo para milhões de pessoas. E ainda assim não estamos tomando as medidas urgentes necessárias”, disse Celeste.

Além de reduzir as emissões de gases de efeito estufa causadas pelo homem, que causam o aquecimento global, a OMM quer que os recursos de água doce do mundo sejam melhor monitorados, para que os sistemas de alerta precoce possam reduzir os danos às pessoas e à vida selvagem.

“Não podemos gerir o que não medimos”, frisou Celeste.

Stefan Uhlenbrook, diretor do departamento de hidrologia, água e criosfera da OMM, enfatizou a importância de investir em infraestrutura para preservar a água e proteger as pessoas dos perigos. Mas ele também destacou a necessidade de conservar água, especialmente para a agricultura, que utiliza 70% do consumo mundial de água doce. Ele alertou que retornar a um ciclo natural da água mais regular seria difícil.

“A única coisa que podemos fazer é estabilizar o clima, o que é um desafio geracional”, disse ele.

Governo vai conceder pontes que ligam o Brasil a outros países

O governo dará início em dezembro a um projeto para conceder ao setor privado todas as 12 pontes que ligam o Brasil a outros países. O Executivo federal considera a iniciativa inovadora e diz que a medida vai trazer ganho de eficiência e permitir a redução do tempo de despacho das cargas que atravessam a fronteira. Além disso, o Ministério dos Transportes calcula uma economia com custo de manutenção de R$ 1 bilhão ao longo dos 30 anos dos contratos.

Na primeira etapa serão leiloadas seis pontes, sendo a primeira a que liga São Borja, no Rio Grande do Sul, a Santo Tomé (Corrientes, na Argentina). O edital será lançado neste mês, e o leilão está previsto para dezembro. Vencerá o certame quem oferecer o menor pedágio.

Negociações no Mercosul

As negociações entre os governos brasileiro, argentino e paraguaio estão em andamento para a concessão das pontes de Uruguaiana, que liga a Paso de Los Libres (Argentina), e da Amizade, entre Foz do Iguaçu e a Cidade do Leste (Paraguai). A expectativa é fazer a concessão no segundo semestre de 2025.

Os trabalhos envolvem os ministérios dos Transportes, responsável pelos projetos, de Relações Exteriores, da Agricultura, além de representantes do Fisco e da Polícia Federal. O andamento também passa por acordos bilaterais.

A ponte de São Borja foi escolhida como modelo a ser replicado para as demais. É a única operada pela iniciativa privada: foi concedida em 1996 por 25 anos, e o contrato vem sendo prorrogado nos últimos anos.

Segundo o Ministério dos Transporte, São Borja é a ponte que está em melhores condições estruturais e tem menor tempo de espera no desembaraço aduaneiro porque o serviço é unificado entre os dois países. Nas demais, o despacho e a fiscalização fitossanitária ocorrem nas duas cabeceiras da ponte por cada país.

O investimento na obra é estimado em U$ 45,6 milhões. A concessão inclui projeto, construção, conservação, operação e exploração da ligação rodoviária internacional. As obras também devem incluir melhorias nos acessos rodoviários à estrutura nos dois lados da ponte.

A expectativa do ministério é que, com a nova concessão da ponte de São Borja, o valor do pedágio, hoje entre US$ 15,40 e US$ 23,10 (dependendo do número de eixos dos caminhões), caia 18%.

Pedágio em dólar

Com 1,4 mil metros sobre o Rio Uruguai e 14 quilômetros de acessos, o ativo tem despertado o interesse de investidores estrangeiros e nacionais, segundo a secretária Nacional de Transportes Rodoviários, Viviane Esse. O trecho curto não exige altos investimentos, e o pedágio é cobrado em dólar, o que dá segurança aos operadores, explicou.

Outra estrutura que será concedida é a ponte que liga Uruguaiana e Paso de los Libres, considerada um dos principais acessos do Brasil a países do Mercosul. Ela responde por 37% do comércio terrestre entre Brasil e Argentina e 30% com o Chile, segundo o governo.

O governo espera reduzir o tempo de despacho aduaneiro. Hoje, esse trabalho costuma demorar 24 horas, e a expectativa é diminuir para quatro horas. A ponte tem cerca de 1,5 quilômetro sobre o Rio Uruguai.

Nos planos do governo, também está fazer a concessão conjunta das pontes da Amizade e de Integração, entre Foz do Iguaçu e o Paraguai. De acordo com o modelo de concessão, a da Amizade será exclusiva para sacoleiros a pé, enquanto a da Integração vai concentrar veículos de carga.

Segundo a secretária, o desembaraço aduaneiro mais rápido, em uma única etapa, beneficia, principalmente o transporte de alimentos. Ela citou como exemplo o salmão que vem do Chile para o Brasil: a carga frigorificada, que demanda um controle preciso e constante da temperatura para garantir a qualidade dos produtos, precisa ser fiscalizada duas vezes, o que não é recomendável. Além de possíveis efeitos para a qualidade do produto, destacou, essa demora no transporte envolve custos de logística mais altos.

Gargalo em Foz do iguaçu

A ponte da Integração ficou pronta há cerca de dois anos, mas até hoje não foi liberada. São 760 metros de pista, torres de sustentação de 120 metros de altura e o maior vão livre da América Latina. As obras custaram R$ 322 milhões, pagos por meio de uma parceria entre o governo do Paraná e a usina hidrelétrica Itaipu Binacional. A liberação dessa ponte esbarra na demora para a conclusão de obras na fronteira.

Por causa do tráfego elevado na Ponte da Amizade, caminhões vazios só podem cruzar a ponte depois das 19h. Segundo o secretário-executivo do Ministério dos Transportes, George Santoro, o governo optou pelas concessões das pontes para reduzir a burocracia e trazer ganhos para os dois lados. Ele mencionou que os contratos atuais têm cláusulas “pitorescas”: por exemplo, um país faz a manutenção de metade da ponte e o outro, do restante. Caso um não disponha de recursos ou de equipe para fazer a intervenção, o serviço não pode ser feito.

Foi o que aconteceu com a ponte de Uruguaiana no passado, lembrou Viviane. A demora em fechar acordo com a Argentina levou a restrição de tráfego no trecho porque um pilar da ponte do lado brasileiro foi danificado. Atualmente, o estado do pavimento da ponte é alvo de críticas, mas o governo brasileiro não conseguiu fechar um acordo com o país vizinho, que alega não dispor de recursos para executar a obra.

— Com as concessões, reduziremos a burocracia, ganharemos eficiência e, consequentemente, as relações comerciais com os países vizinhos vão aumentar — disse a secretária, acrescentando: — Fazer qualquer intervenção nesses trechos é um processo complicado porque as duas partes precisam estar de acordo.

Com as concessões, o Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (Dnit) poderá usar recursos economizados para fazer manutenção de outras vias. Por ano, haverá uma economia em torno de R$ 30 milhões — valor suficiente para duplicar pequenos trechos de estradas, fazer recapeamento de vias e ampliação de acesso.

Estruturas que serão licitadas

Pontes prontas para serem concedidas:

Pontes a serem construídas e operadas pelo setor privado:

Pontes em obra pelo governo brasileiro para futura concessão:

Tarifa cara impacta consumo de gás no país

Em agosto deste ano, a tarifa média do gás usado pela indústria foi de US$ 13,82 por milhão de BTU, de acordo com a Associação Brasileira dos Grandes Consumidores de Energia e Consumidores Livres (Abrace). É um valor bem superior ao de mercados como os EUA e a Argentina, em torno de US$ 2 por milhão de BTU, e uma barreira a ser vencida por esse segmento para estimular a demanda pelo insumo.

— O cenário não é animador. Temos hoje um preço totalmente desalinhado com o das principais economias do planeta. Nosso gás é caro, temos pouca competição e nossa indústria está perdendo competitividade a cada dia que não resolvemos essa questão — diz Adrianno Lorenzon, diretor de gás natural da Abrace.

Segundo Oswald Nunes, especialista no setor de gás, o Brasil precisa caminhar em diferentes frentes, desde aumento da produção até a simplificação da legislação, já que as regras variam entre os estados do país.

—Precisamos de unificação das regras para permitir a criação de um mercado livre no gás. Não adianta ter mais produção e leilões da PPSA, se as empresas não conseguem acessar as redes estaduais de gás de forma econômica. Por isso, a nova legislação vai se debruçar sobre ter uma harmonização entre os estados, mas o caminho é longo. Hoje temos preços elevados, pois há muitas barreiras para permitir a concorrência — disse Nunes.

O Brasil, avaliam especialistas, precisa desenvolver novas formas de monetizar o gás para reduzir seus preços. Segundo Edmar Almeida, professor do Instituto de Economia da PUC-RJ, embora o país passe por um momento de crescimento na oferta de gás, a infraestrutura é um desafio:

— Mais de 80% do gás são associados ao petróleo. Isso cria desafios para aumentar a oferta em termos de infraestrutura, e nem sempre isso é entendido pelo mercado. Por outro lado, com os preços no mercado internacional estabilizados, há aumento de importação de GNL (gás em formato líquido), que pode ocupar o espaço de quem produz aqui — explica Almeida.

Acordo com a argentina

Ao mesmo tempo, há esforços para trazer o gás barato da Argentina ao Brasil. Eduardo Javier Rodríguez Chirillo, secretário de Energia da Argentina, que esteve no ROG.e, disse que a conclusão do processo de reversão do gasoduto que liga as reservas do campo de Vaca Muerta, no Oeste do país, ao norte da Argentina, deve terminar em março de 2025.

A operação é essencial para permitir a exportação de gás para o Brasil por meio da Bolívia. A expectativa é que, com essa mudança, o país possa receber em torno de 4 milhões de metros cúbicos por dia.

Chirillo destacou que a Argentina passa por um processo de transição regulatória e precisa considerar aspectos como preços e demanda interna antes de definir quanto será o volume enviado para o Brasil. O secretário afirmou que, nas próximas semanas, deverá ser assinado um memorando de entendimento com o governo brasileiro:

— O memorando é muito significativo porque somos facilitadores para que as empresas façam as coisas.

Empresas que atuam na Argentina também já desenvolvem planos para o Brasil. Sem dar detalhes, Fausto Caretta, diretor da Pan American Energy, maior empresa privada de energia argentina e maior produtora privada de gás de Vaca Muerta, disse no evento de óleo e gás no Rio de Janeiro que está de olho no mercado brasileiro.

— O Brasil importa GNL dos Estados Unidos. E podemos competir com esse gás de alguma forma. Há muitas coisas que podemos otimizar e nas quais temos que trabalhar — afirmou.

Inteligência artificial traz infinitas possibilidades para as empresas

O Podcast do Correio recebeu, nesta terça-feira (1º/10), o engenheiro Giovanni Pascotto Bonin, que avaliou o avanço do uso da inteligência artificial no dia a dia das empresas e da sociedade. Mestre no assunto pela Universidade de Michigan e em ciências da computação pela Universidade de Miami, Giovanni diz que o tema está em grande evidência no momento por conta do volume de aplicações existentes. “Além disso, as empresas têm visto oportunidades de cortar custos e observar métricas de maneira mais fácil”, destacou ele, que é sócio da Tecto, em entrevista aos jornalistas Mariana Niederauer e Roberto Fonseca.

Para Giovanni, a inteligência artificial é uma ferramenta que consegue reduzir a burocracia, aumentar a produtividade e a prosperidade, trazer melhorias em saneamento e infraestrutura, além de permitir a redução do tempo gasto em tarefas rotineiras.

Na avaliação de Giovanni, a inteligência artificial pode ser uma grande aliada dos pequenos negócios. “Ao se analisar um grande centro de custo de tempo, como as conversas no WhatsApp, o processo de venda para um cliente ou a listagem de todos os produtos que se têm no catálogo, isso acaba sendo um desafio para o pequeno empreendedor. Com a inteligência artificial, é viável uma automatização da conversa. Esse processo, que poderia ser um limite de escala para uma empresa, é resolvido com a ferramenta que trabalha as 24 horas do dia”, diz ele, que tem mais de 10 anos de experiência liderando equipes de engenharia em rápido crescimento, com atuação em gigantes da tecnologia, como Intel, e na liderança de startups promissoras até o IPO, como a Coursera, no Vale do Silício, na Califórnia, nos Estados Unidos.

Em relação à educação, Giovanni afirma que a inteligência artificial pode resolver bastante problemas. Como exemplo, ele explica a possibilidade de pegar um assunto como a Teoria da Relatividade e transformar o conteúdo de uma forma que uma criança acharia que está assistindo a um canal de entretenimento. “Isso poderia ser escalonado ao colocar a ferramenta na mão de um professor que está tendo dificuldades para tratar um tema com um aluno. Essas ferramentas trazem infinitas possibilidades de resolver a educação, de resolver qualquer problema de qualquer fase”, diz o engenheiro.

Segundo Giovanni, a inteligência artificial também permite um aumento da criatividade. Com ela, é possível renderizar uma ideia praticamente da forma idealizada, aumentando a criatividade quando o artista consegue visualizar o que tem em mente. “A gente está falando de um artista individual, uma pessoa que não tem os recursos de uma Netflix, por exemplo, mas consegue criar como a Netflix cria”, afirma.

Sobre os limites éticos do uso da inteligência artificial, Giovanni acredita que não se pode dar todo o poder de tomada de decisões para a ferramenta, sendo isso uma escolha da sociedade. De acordo com ele, as vantagens da IA são enormes, sendo necessário que pessoas boas, que desejam ver seus valores materializados, se engajem e não tenham medo. “Eu vejo hoje que, no Brasil, tem-se mais potencial de empreender e criar uma empresa forte do que nos Estados Unidos. Vejo mais oportunidade aqui do que lá”, completa.

* Estagiário sob a supervisão de Roberto Fonseca

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Qualidade do ar: menos falácias, mais esclarecimento

Reduzir a concentração de poluentes na atmosfera é um desafio e objetivo do estado de São Paulo. Somos destaque nacional como único estado do Brasil a adotar a meta 2 da Organização Mundial da Saúde (OMS) de concentração de gases e materiais particulados no ar —o mais recente relatório da OMS descreve 4 níveis intermediários de metas a serem perseguidas, sendo que, no Brasil, apenas São Paulo já aplica a meta 2, mais rigorosa.

Segundo a própria OMS, o nível ideal ainda não foi atingido pelas nações onde vivem 99% da população mundial. O Brasil prevê chegar nesse nível em 2044. Em São Paulo, estamos atuando com consistência a partir de um plano robusto, com ações de curto, médio e longo prazo, que já estão dando resultado.

A evolução na qualidade do ar tem que ser olhada historicamente, pelas médias diárias e anuais e não por recortes de horários ou à luz do evento extremo que vivemos nestes meses por conta da severa estiagem e do grande número de queimadas. Nossos gráficos históricos demonstram uma redução considerável na concentração de poluentes ao longo das décadas. No particulado maior (MP10), por exemplo, a queda de concentração foi de 70% de 1985 a 2023.

Realizamos medições há 40 anos, por meio de equipamentos certificados e de referência mundial. A rede da Cetesb, agência ambiental estadual, tem 85 estações físicas que cobrem todo o território. Nossos dados são rastreáveis e confiáveis, enquanto informações que vêm sendo utilizadas para classificar São Paulo em um ranking de cidades mais poluídas, gerando desinformação, são de uma empresa que comercializa sensores e purificadores de ar.

Nossa inteligência nos permite atuar de forma estratégica, observando as criticidades de cada região. Só neste ano declaramos quatro vezes estado de atenção por conta da qualidade do ar, a última em setembro, na cidade de Santa Gertrudes. Quando isso acontece, um plano é iniciado, com a adoção de medidas restritivas e sanções. Ainda, há que se observar diferenças entre países. Veículos leves no Brasil, por exemplo, diferem daqueles da Europa —enquanto estes muitas vezes são a diesel, os nacionais são “mais limpos” (na pandemia de Covid-19, mesmo com carros na garagem, não houve redução nos níveis de MP10).

O mapa de qualidade do ar no site da Cetesb oferece informação em tempo real, gratuita e acessível, e apresenta as medições em índices de qualidade (boa, moderada, ruim, muito ruim e péssima). Comparar os índices com as concentrações da OMS é o mesmo que comparar banana com laranja; são dados diferentes.

Os índices são uma forma de tornar mais compreensível para a população o tema da qualidade, facilitando o entendimento e ampliando a transparência.

Além desse acompanhamento permanente e da adoção de medidas regionalizadas, também é feita continuamente a fiscalização de veículos pesados para coibir abusos. Essas ações se somam à maior operação de prevenção e combate a queimadas que o Brasil já viu. A operação São Paulo Sem Fogo, que começa com ações preventivas em abril, antes da seca, conta com mais de R$ 170 milhões em investimentos e um efetivo que supera 15 mil pessoas.

Todos esses esforços atacam as consequências dos extremos climáticos, mas é preciso dizer que não temos nos esquecido das causas, pelo contrário. O Plano de Ação Climática do estado, com horizonte até 2050, e o Plano Estadual do Meio Ambiente contam com ações concretas em diversos eixos, como transporte, energia, indústria, resíduos e agropecuária, com foco também nos temas de biodiversidade, bioeconomia, preservação de unidades de conservação, educação e conscientização ambiental, fortalecimento institucional, resiliência e adaptação climática.

O desafio é urgente e exige ação de todas as esferas tanto no campo da mitigação quanto da adaptação e resiliência climática.

No que compete ao estado de São Paulo, temos investido muito e atuado de forma planejada, com a gravidade que demanda a situação.

TENDÊNCIAS / DEBATES

Os artigos publicados com assinatura não traduzem a opinião do jornal. Sua publicação obedece ao propósito de estimular o debate dos problemas brasileiros e mundiais e de refletir as diversas tendências do pensamento contemporâneo.

Sem obrigação de votar, idosos podem decidir eleições no próximo domingo

Amanhã, 1º de outubro, serão celebrados o Dia Nacional do Idoso (que comemora os 21 anos do Estatuto do Idoso) e o Dia Internacional da Terceira Idade (instituído pelas Nações Unidas), ambos com o objetivo de chamar a atenção da sociedade para as demandas e necessidades dessa parcela da população. No Brasil, a mudança do formato da pirâmide etária revelada pelo Censo de 2022, com o aumento da população adulta, tem impacto direto no perfil do eleitorado que vai às urnas no próximo domingo. O voto, aqui, é obrigatório, exceto para quem é analfabeto, tem 16 e 17 anos de idade ou mais de 70 anos. Esses eleitores não precisam justificar ausência nas votações nem sofrem qualquer tipo de penalidade por parte da Justiça Eleitoral caso decidam não participar do pleito.

O candidato a prefeito ou vereador que não dá atenção, principalmente, ao grupo de eleitores da terceira idade, está abdicando de um cesto de votos em que cabem quase 10% do eleitorado brasileiro — 10 vezes mais do que o da faixa etária de 16/17 anos registrada para votar no próximo domingo. A quantidade de eleitores seniores é expressiva e pode decidir um pleito, principalmente, nas cidades em que a disputa está mais acirrada, como São Paulo, Belo Horizonte e Fortaleza.

“O voto desse segmento pode ser determinante em alguns cenários, em que a eleição tem três ou mais candidatos competitivos brigando para chegar ao segundo turno. Qualquer voto a mais pode fazer diferença. Nesses cenários, o comparecimento dos idosos, que são milhões, podem, de fato, definir uma eleição”, avalia o cientista político e especialista em eleições Leandro Gabiati, diretor da Dominium Consultoria.

Para o primeiro turno, daqui a uma semana, há mais de 14 milhões de pessoas com 70 anos ou mais em condição de votar, um crescimento de 9,02% em relação ao pleito municipal de 2020. Para comparar, o Brasil tem 1,5 milhão de adolescentes aptos. A maior parte dos eleitores veteranos está na Região Sudeste: são 7,3 milhões de pessoas, 11% da população votante. Na sequência, vem o Nordeste, com 3,7 milhões (8,5%); o Sul, com 2,8 milhões (10,7%); o Norte, com 843,6 mil (6,4%); e o Centro-Oeste, com 793 mil (8,1% da região).

Por estado, São Paulo lidera com 3,4 milhões de eleitores com mais de 70 anos, seguido por Minas Gerais (1,8 milhão) e Rio de Janeiro (1,7 milhão). Roraima, Amapá e Acre apresentam os menores números absolutos: 22 mil, 30 mil e 38,8 mil, respectivamente.

Por faixas etárias, 10,3 milhões têm entre 70 e 79 anos. Na faixa imediatamente acima, de 80 a 89 anos, são 3,6 milhões. Acima dos 90, são mais 1,1 milhão de eleitores, incluindo quase 214 mil brasileiros e brasileiras que passaram dos 100 anos. No recorte de gênero, as mulheres formam uma ampla maioria nesse grupo dos idosos, com 8,5 milhões em condições de votar, contra 6,6 milhões de homens.

idosos votos

O problema é que os candidatos mais competitivos, em geral, não dedicam muita atenção aos idosos na hora de fazer promessas. Para Leandro Gabiati, esse é um erro de quem está na disputa eleitoral. “Um candidato a prefeito ou vereador pode propôr mais espaços comunitários, como academias ao ar livre, tem a questão da mobilidade, da infraestrutura para que esse eleitor possa se locomover de forma segura nas ruas, (a questão da) iluminação pública, há uma variedade importante (de medidas) em que os candidatos podem cativar esse eleitorado”, diz o analista político.

Mas não é isso que se vê no atual debate político, ainda contaminado pela polarização ideológica. Por outro lado, essa falta de propostas abre espaço para quem enxerga nessa parcela da população uma oportunidade de ampliar suas intenções de voto. “Infelizmente, as discussões sobre políticas públicas estão ficando em segundo plano, mas um candidato inteligente que souber elaborar uma plataforma de propostas importantes pode, eventualmente, chamar a atenção dessa faixa do eleitorado e obter um apoio que, em eleições mais acirradas, faz a diferença”, lamenta Gabiati.

Em alguns estados, como o Paraná, tribunais regionais eleitorais e outras instituições estão incentivando os eleitores mais velhos a exercer o direito de voto. Para o desembargador Sigurd Roberto Bengtsson, presidente do TRE-PR, “o idoso não pode se omitir porque o voto representa a cidadania, é importante para ele votar, marcar sua presença e participar da sociedade”. Em algumas cidades, como Ponta Grossa, os cartórios eleitorais vão montar seções de votação em casas de longa permanência para idosos, para permitir que os residentes votem sem sair da instituição, no âmbito do programa “Cidadania plena — Todo voto importa”, da Corte paranaense.

No Piauí, o Ministério Público recomendou, na semana passada, às instituições de longa permanência que assegurem aos residentes transporte e, se for preciso, acompanhantes. Muitos cartórios eleitorais também vêm promovendo palestras, desde o ano passado, sobre o assunto. “Ainda que, perante a lei, os idosos não precisem votar, é importante escolher candidatos e candidatas que estejam comprometidos com as causas desse perfil do eleitorado. A política não deixa de fazer parte da vida depois que chegamos na terceira idade”, explica o chefe do cartório eleitoral de Primavera do Leste, em Mato Grosso, Rodrigo Filippini.

Os eleitores idosos têm que tomar cuidado, porém, com as informações falsas que circulam nas redes sociais sobre as eleições do dia 6. Uma das fake news mais compartilhadas mostra um suposto aviso do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) que informa que o voto serve de prova de vida para o INSS. O presidente do instituto, Alessandro Stefanutto, alertou que cabe apenas ao INSS “comprovar que o beneficiário está vivo”. Para isso, recebemos dados de outros órgãos públicos federais, preferencialmente biométricos, para realizar cruzamento de informações de cidadãos e cidadãs. Essas informações são cruzadas com outras que constam na base do governo federal”, explicou o presidente.

Em março, o Ministério da Previdência Social editou uma portaria que impede, até 31 de dezembro, o bloqueio de pagamentos de benefícios a quem não apresentar prova de vida. “Não há motivo para pânico ou correria aos bancos para fazer prova de vida”, disse Stefanutto.

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Por que Brasília não tem prefeito?

Em outubro, 5.569 municípios brasileiros elegerão prefeitos e vereadores — mas Brasília e outras regiões administrativas do Distrito Federal, também chamadas “cidades-satélites”, não estão nesta conta.

A área tem uma organização política distinta por que o Distrito Federal acumula características de município e Estado, e suas “cidades-satélites” não são tratadas como municípios.

“Quando Brasília foi inaugurada, em 1960, o modelo administrativo estabelecido se assemelhava um pouco mais a um Estado, englobando responsabilidades que, em outras regiões, seriam divididas entre prefeitos e governadores estaduais. Assim, o título de ‘prefeito’ foi substituído por ‘governador'”, explica o historiador Matheus Rosa, mestre pela UnB e pesquisador da história regional.

E como capital federal, diz Rosa, a ideia era que Brasília pudesse funcionar de maneira independente e imparcial, sem o impacto de disputas regionais.

Mas, ainda que haja semelhanças com administrações estaduais, o Distrito Federal tem características únicas que, há décadas, resultam na falta de eleições municipais.

Para entender as divisões políticas diferentes do resto do Brasil, é preciso olhar para trás, na década de 1950, quando a discussão de transferir a capital federal para o interior do Brasil, que remonta ao início do século 19, começou a ser retomada.

O que é um Distrito Federal – e por que não pode ser considerado um Estado

Diferentemente dos Estados, o Distrito Federal possui uma estrutura administrativa singular, com maior centralização de algumas funções no governo federal.

Embora o DF tenha um governador e uma câmara legislativa própria, algumas funções, como segurança pública e assuntos judiciais, são geridas ou supervisionadas pelo governo federal.

Aspectos como tributação e regulação do transporte coletivo entre municípios e Estados vizinhos, por exemplo, que normalmente seriam responsabilidade do governo estadual, no DF ficam a cargo da União.

A ideia de um Distrito Federal no Brasil vem desde o Império, quando, em 1834, foi criado o “município neutro”.

O objetivo era separar a administração do Rio de Janeiro, então capital do Império, para garantir uma gestão especial por ser sede do governo.

“Já havia, então, essa ideia de que a capital do país deveria ter uma administração local com status diferenciado das demais Províncias ou regiões do Brasil”, diz Rosa.

Na prática, explica o historiador, o município neutro funcionava como um município comum, com sua Câmara Municipal e prerrogativas.

“Porém, alguns serviços essenciais, como polícia e corpo de bombeiros, eram controlados diretamente pelo governo central. Com a Proclamação da República, esse conceito evoluiu para o Distrito Federal, nome que refletia a influência do modelo republicano americano, especialmente na questão federativa.”

O Centro-Oeste como escolha do DF

O Rio de Janeiro foi a capital do Brasil entre 1793 e 1960. Durante os 167 anos como sede, a ideia de transferir o poder nacional para o centro do Brasil era comum a vários goverantes.

De acordo com o historiador Matheus Rosa, não existe um único motivo para essa transferência — ela foi impulsionada por diferentes razões em épocas distintas.

“Um dos principais fatores sempre foi a questão da segurança nacional. O Rio de Janeiro, sendo uma cidade litorânea, era considerada vulnerável tanto a invasões estrangeiras quanto a revoltas internas, devido à crescente urbanização e nova visão do local como uma ‘cidade de proletários’ ao longo do século 19 e início do século 20.”

O professor Antônio Carpintero, do Departamento de Teoria e História da Arquitetura e Urbanismo da UnB, descreve o primeiro estudo da área que viria a se tornar o Distrito Federal.

“O governo de Floriano Peixoto nomeou uma comissão, chamada Comissão Cruls, em 1890, que fez um relatório detalhado sobre a região. O relatório localizou um retângulo no Planalto Central para a criação do Distrito Federal. Mas o assunto ficou em suspenso. Floriano Peixoto deixou o relatório pronto para Prudente de Morais, que acabou arquivando o projeto.”

O plano sofreu mudanças e atualizações nos governos seguintes, até que ganhou mais tração a partir do governo de Getúlio Vargas e, especialmente, do de Juscelino Kubitschek, o presidente que de fato efetivou a transferência da capital do Rio para a recém construída Brasília.

“Quando lançou sua candidatura, Kubitschek conciliou as diferentes leituras do projeto e deu prioridade à mudança da capital, apesar da oposição de alguns setores políticos que queriam que continuasse no Rio”, lembra Carpintero.

A mudança passou a ser vista como uma forma de descentralizar a população, que estava majoritariamente concentrada no litoral, e ocupar o interior, especialmente o Centro-Oeste.

“O processo de integração nacional também envolvia a ocupação de terras que, embora consideradas ‘desocupadas’, já eram habitadas por povos indígenas e populações tradicionais”, diz Matheus Rosa.

“Assim, Brasília simbolizava não só a expansão econômica para o interior, impulsionada pelo agronegócio, como também a criação de uma rede de infraestrutura que incluía rodovias, ferrovias e aeroportos, promovendo a integração do território e a expansão do mercado interno.”

A integração também envolvia a criação de uma infraestrutura robusta, que incluía energia, transportes — como rodovias, ferrovias e aeroportos —, facilitando a integração do território e a expansão do mercado interno.

“A expansão do mercado interno era vista como uma forma de superar a condição de exportador de matérias-primas e transformar o Brasil em uma nação industrializada, moderna, segundo a visão do século 20 sobre o que seria uma nação desenvolvida. Isso incluía explorar as riquezas minerais e agrícolas do interior e ampliar o consumo dessas regiões.”

Nos anos 1930 e 1940, durante a expansão demográfica e econômica, foram pensadas várias soluções e tamanhos diferentes para o Distrito Federal.

O formato atual, de 5.760 km² e dividido entre regiões administrativas — e não municípios —, foi concebido em 1955 por meio de uma comissão militar, que se encarregou de localizar a cidade de Brasília dentro do Distrito Federal e definir seus limites geográficos.

“No contexto brasileiro, o distrito é a menor circunscrição territorial autônoma, com uma relativa autonomia, mas com tamanho menor do que vários municípios brasileiros. Sua criação visou evitar que um Estado tivesse precedência sobre os outros, garantindo que a capital fosse neutra e independente”, descreve Antônio Carpintero, do Departamento de Teoria e História da Arquitetura e Urbanismo da UnB.

Para comparação, vale ressaltar que a área do Estado de São Paulo é 43 vezes maior do que a área do Distrito Federal. o Rio de Janeiro tem área 7 vezes maior do que a do DF e por sua vez o Estado de MInas Gerais é 100 vezes maior.

O território do DF chega ainda a ser menor que mais de 150 municípios do país.

A área, significativamente menor do que outras unidades federativas, também contribui para uma governança mais centralizada.

Brasília se tornou oficialmente a capital federal em 1960

A prefeitura que durou 9 anos

Embora não exista mais atualmente, Brasília teve uma prefeitura entre 1960, ano de sua criação, e 1969.

Conforme explica o historiador Matheus Rosa, o termo “prefeitura do Distrito Federal” já era usado no Rio de Janeiro quando era a capital, e foi transferido para Brasília.

“A administração do Distrito Federal, após a transferência, foi inicialmente regida por uma lei de 1960, semelhante ao que se tinha até então, ou seja, um prefeito nomeado pelo presidente da República e uma Câmara de vereadores funcionando à parte.”

Em 1969, durante a ditadura militar, uma emenda à Constituição de 1967 extinguiu a figura do prefeito. A partir dali, o comando mudou.

“O que aconteceu em 1969 foi a mudança do nome de ‘prefeito’ para ‘governador’, sem alterar muito na prática”, diz o historiador. Essa situação se mantém até hoje.

Uma possível razão para essa mudança, segundo Rosa, seria uma equiparação entre o Distrito Federal, no Planalto Central, e o Estado da Guanabara, criado em 1960, quando o Rio de Janeiro perdeu o status de capital federal.

“O Estado da Guanabara era uma situação especial, pois era um Estado formado por um único município, com o governador acumulando funções de prefeito. A emenda constitucional que instituiu o ‘governador’ do Distrito Federal também consolidou esse acúmulo de funções na Guanabara.”

Em 1975, quinze anos depois, a Guanabara se fundiu com o Estado do Rio de Janeiro.

Outra hipótese, explica Rosa, é que essa mudança buscava conferir mais prestígio político à figura do governante de Brasília, já que, na época, muitos dos ministérios e órgãos do governo federal ainda operavam no Rio de Janeiro.

“A partir do governo Médici, em 1969, houve uma determinação maior para transferir essas estruturas para Brasília. Assim, a mudança de prefeito para governador pode ter sido uma tentativa de conferir a Brasília um status maior.”

Ainda que hoje a prefeitura não exista mais, os cidadãos do DF ainda podem ser convocados para serem mesários, já que existe a necessidade de voto para pessoas que residem na área, mas estão registradas em outros locais.

“Também vale dizer que parte dos residentes de Brasília estão de olho nas eleições dos municípios de Goiás, já que a proximidade geográfica faz com que muitos utilizem serviços ou frequentem locais dessas cidades”, aponta o historiador.

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Crianças enfrentam 5 vezes mais dias de calor extremo do que há 50 anos, diz Unicef

Crianças brasileiras enfrentam atualmente em média cinco vezes mais dias extremamente quentes em comparação às crianças de 50 anos atrás, revela relatório divulgado nesta segunda (23) pelo Unicef (Fundo das Nações Unidas para a Infância) no Brasil.

No país, a média de dias com temperatura acima de 35°C passou de 4,9 nos anos de 1970 para 26,6 entre 2020 e 2024. Segundo o levantamento, 33 milhões de crianças estão sendo mais afetadas por essas mudanças climáticas. O país tem 48,7 milhões de crianças e adolescentes até 18 anos, segundo o Censo de 2022.

A análise também chama a atenção para o aumento das ondas de calor, que são períodos de três dias ou mais em que a temperatura máxima está mais de 10% maior do que a média local.

Nesse caso, 31,5 milhões das crianças do país enfrentam duas vezes mais ondas de calor do que seus pais ou avós enfrentaram na década de 1970.

Com o relatório divulgado a duas semanas das eleições municipais, o Unicef faz um alerta para que os candidatos e candidatas às prefeituras se comprometam a preparar as cidades para enfrentar e lidar com as mudanças climáticas, com foco especial nas necessidades e vulnerabilidades de crianças e adolescentes.

O calor extremo causa consequências graves à saúde. Ao ser exposto a altas temperaturas, o corpo humano pode entrar em estresse térmico, tendo dificuldades para funcionar de forma adequada. São comuns sintomas como dores de cabeça, mal-estar e perda da agilidade nas ações.

O estresse térmico é uma das principais causas de mortalidade relacionadas ao calor e está associado também a complicações na gravidez, incluindo doenças crônicas gestacionais, partos prematuros, bebês com baixo peso ao nascer ou mesmo crianças natimortas.

“Nas crianças pequenas, o impacto é ainda maior. A capacidade do corpo de responder e regular a própria temperatura é muito mais baixa em comparação aos adultos”, explica Danilo Moura, especialista em mudanças climáticas do Unicef no Brasil.

Segundo o pediatra Victor Horácio de Sousa Costa Júnior, do Hospital Pequeno Príncipe, o aumento da temperatura vem acompanhado, em geral, pela queda da umidade relativa do ar e alta da concentração de poluentes na atmosfera, o que favorece o aparecimento de doenças como rinite, conjuntivite e asma.

“Como as crianças estão em fase de formação do sistema imunológico e com uma capacidade ruim de se adaptar ao meio, acabam sendo as mais afetadas por essas doenças.”

Mudanças climáticas também podem influenciar na propagação de vetores, favorecendo doenças infecciosas que se espalham em altas temperaturas, como malária, dengue e leishmaniose.

De acordo com Danilo Moura, do Unicef, as temperaturas elevadas causam uma série de outras consequências sociais, por exemplo, podem interferir na capacidade de aprendizado das crianças e adolescentes.

“Há estudos que mostram que a capacidade de retenção de conhecimento de um adolescente quando a temperatura está acima de 30°C é muito mais baixa. O calor é desconfortável, causa um risco cumulativo e silencioso.”

As mudanças climáticas provocam uma série de outras sobrecargas nos serviços públicos. “Há uma pressão enorme sobre os sistemas elétrico e de distribuição de água. O risco desses sistemas começarem a falhar e interromper serviços essenciais é muito grande.”

De acordo com o especialista do Unicef, um outro efeito dos dias de calor extremo é o agravamento das desigualdades socioeconômicas já existentes. “Os mais vulneráveis, que já moram em condições adversas, em casas superlotadas, sem acesso à água e a saneamento básico, sofrem muito mais.”

Para ele, muitas ações para mitigar os efeitos das altas temperaturas dependem dos gestores municipais e que deveriam estar na agenda dos candidatos às prefeituras.

As mais imediatas envolvem, por exemplo, um reforço da comunicação para que as pessoas reconheçam os sinais de que o corpo possa estar sofrendo de estresse térmico e uma rede de saúde preparada para atendê-las com infraestrutura adequada e profissionais capacitados.

Também são sugeridas mudanças de protocolos nas creches e escolas para que as crianças possam beber água com mais frequência.

Mas, para ele, é essencial que os futuros prefeitos priorizem a criação de novas áreas verdes nas cidades e adaptem os prédios públicos para essa nova realidade.

“Qual a discussão que está se fazendo sobre ter áreas verdes dentro das escolas? Escolas de puro concreto, super quentes, é o padrão da arquitetura escolar hoje no Brasil. O que você está fazendo para pensar formas de deixar o ar circular dentro da escola?”, questiona.

De acordo com Moura, a crise climática afetará as crianças e os adolescentes de todas as formas. “Vai afetar a educação, a saúde, a proteção social, a capacidade de desenvolvimento. E vai afetar as crianças mais vulneráveis, as de famílias mais pobres, as negras e as indígenas de forma desproporcional.”

Na sua opinião, o debate público está muito longe de ser capaz de responder ao desafio que está posto, com eventos extremos mais frequentes. “Vamos ter dias mais quentes, ondas de calor mais intensas, que duram mais tempo. Da mesma forma, teremos períodos de seca mais longos, chuvas mais fortes, mais enchentes.”

Para ele, qualquer discussão sobre orçamento e sobre a implementação de políticas públicas precisará levar esse cenário em consideração. “Que estratégias de adaptação das cidades esses prefeitos e prefeitas vão adotar?”

G20 no Brasil: Clima e combate à pobreza energética estão entre desafios da descarbonização

Um dos desafios do Brasil e do mundo na descarbonização será reduzir a pobreza energética, tema que abrange universalização dos serviços, tarifas de energia, percentual da renda dedicada aos pagamentos da conta de luz e qualidade dos serviços. Dados de consulta do Inteligência em Pesquisa e Consultoria Estratégica (Ipec), encomendada pelo Instituto Pólis e divulgada em junho, mostram que 36% das famílias gastam metade ou mais da sua renda mensal com meios para cocção de alimentos e energia elétrica.

Para quem possui renda familiar acima de cinco salários mínimos, a conta de luz causa menos impacto. Apenas 16% das pessoas nessa faixa de renda disseram ter metade ou mais de sua renda comprometida com pagamento de energia. No caso de renda familiar de até um salário mínimo, o percentual sobe para 53%. A análise também mostra que a população negra sofre mais para pagar a conta de luz, visto que 43% das famílias gastam metade ou mais de sua renda com energia.

Hoje, no Brasil, um em três consumidores das regiões Norte e Nordeste gasta mais de 6% da renda com a conta de luz, enquanto no Sul, Sudeste e Centro-Oeste um em cada seis destina mais que esse percentual.

Falta de acesso a serviços

A queima de lenha para aquecer residências ou fazer refeições é ainda uma realidade no país: representa cerca de um quarto da matriz residencial energética.

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— A questão da pobreza energética no Brasil está associada à falta de acesso a serviços modernos, à dependência de combustíveis poluentes, como a lenha, à infraestrutura inadequada, à baixa renda e à implementação de políticas governamentais ineficazes. Um estudo recente faz a relação entre pobreza energética e segurança alimentar por meio do uso dos refrigeradores. Para a conservação de alimentos, a população mais pobre utiliza refrigeradores antigos, com baixa eficiência — diz Elaine Cristina Silva dos Santos, pós-doutoranda do Instituto de Estudos Avançados da USP.

O governo trabalha em um programa para substituir o uso de lenha e carvão pelos mais pobres. A Empresa de Pesquisa Energética (EPE) lançou recentemente nota técnica que condensa experiências internacionais, para aprofundar o debate sobre a pobreza energética no Brasil.

— Recentemente, o governo brasileiro, além do programa Luz para Todos, que foca na universalização da energia, lançou outros projetos relacionados à pobreza energética. Um deles é o Tecendo Conexões, que servirá para mapear e formar um diagnóstico sobre a pobreza energética no país. Ainda não sabemos se essas iniciativas serão suficientes para a necessidade de energia somada às mudanças climáticas— diz Elaine Santos, pós-doutoranda do Instituto de Estudos Avançados da USP.

Para Joísa Dutra, diretora da FGV-Ceri (Centro de Estudos em Regulação e Infraestrutura), que tem participado de mesas de debates do G20 sobre a transição energética, o tema tem várias camadas e ganha outras interpretações além do percentual gasto pelas famílias com eletricidade:

—A questão climática traz mais preocupações, seja pela necessidade de resiliência das redes elétricas, seja porque as pessoas buscarão equipamentos que possam trazer conforto nas ondas de calor. Isso faz com que a regulação se torne central.

A tarifa no Brasil não captura diferenças entre classes sociais e diferentes tipos de consumidores, nem considera indicadores de qualidade.

— O cliente de Ipanema tem uma realidade distinta do cliente da Ilha do Governador. Qualidades de serviço e investimentos podem ser bem diferentes. A regulação precisa começar a enxergar essas nuances e avaliar a diferença da qualidade dos serviços ofertados em áreas diferentes de uma concessão — diz Joísa Dutra.

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Recentemente, o governo federal divulgou um decreto que servirá de base para a renovação dos contratos de distribuidoras cujo prazo do contrato de 30 anos vai expirar entre 2025 e 2031. São empresas que representam cerca de 60% do mercado, incluindo as duas maiores capitais do país, São Paulo e Rio. O decreto, cuja regulamentação será feita nos próximos meses pela Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), é um passo na direção da modernização do setor e da equidade tarifária, diz Joisa.

Uma outra questão envolvida na pobreza energética são as perdas não técnicas (os “gatos”, no jargão do setor). Para Vinícius Oliveira da Silva, do Instituto de Energia e Meio Ambiente (Iema), o governo tem uma oportunidade na mão: o processo de eventual mudança do controle da Amazonas Energia, distribuidora do maior estado do país e cujo índice de perdas não técnicas chega a quase 50%, o mais alto do Brasil.

Contrato em novas bases

No momento, discute-se a transferência de controle da distribuidora para outro grupo econômico, o que pode abrir espaço para rediscussão do contrato sob as novas bases reforçadas pelo decreto.

—O modelo regulatório da distribuidora precisa enxergar as particularidades da área de concessão, cujos 62 municípios têm diferentes realidades e desequilíbrios. As perdas não técnicas são um acesso paralelo à energia. As pessoas precisam de luz e buscam um caminho. Isso ocorre em números elevados também no Rio. A inovação regulatória é fundamental — destaca Silva.

Horário de verão pode voltar sob Lula: quais são os prós e os contras

O horário de verão voltou ao debate, diante das notícias de que o governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) estuda a volta da prática, em meio à seca recorde que assola o país e à proximidade dos meses mais quentes do ano.

A medida, que adianta os relógios em uma hora, era adotada anualmente em partes do Brasil para diminuir o consumo de energia pelo melhor aproveitamento da luz natural, mas foi extinta em 2019, durante o mandato de Jair Bolsonaro (PL).

À época, o governo argumentou que a economia de energia produzida era pouco significativa e não justificava a mudança.

Em declarações recentes, o ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira, tem defendido a volta do horário de verão, argumentando que a medida cumpre dois objetivos importantes na gestão do sistema elétrico: garantir a segurança energética e a modicidade tarifária – isto é, que a conta de luz tenha preço justo.

“Todos os dados de pesquisas anteriores são positivos, fomenta a economia em diversos setores do Brasil, como turismo, bares, restaurantes e muitos outros segmentos. Ele também é importante para diminuir o despacho de termelétricas no horário de ponta”, disse Silveira em entrevista coletiva.

Segundo o ministro, a medida precisa ser estudada, porque impacta a vida das pessoas. E também depende de uma decisão política do governo.

A Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) e o Operador Nacional do Sistema (ONS) devem apresentar nos próximos dias um estudo sobre o horário de verão nas atuais circunstâncias. A decisão final caberá a Lula.

História do horário de verão no Brasil

O horário de verão foi instituído pela primeira vez no Brasil em 1931, durante o governo de Getúlio Vargas.

“A prática dessa medida, já universal, traz grandes benefícios ao público, em consequência da natural economia de luz artificial”, dizia o texto do decreto assinado por Vargas, datado de 1º de outubro daquele ano.

Horário de verão foi instituído no Brasil em 1931 no governo Getúlio Vargas

A medida foi repetida em anos seguintes, sem regularidade. A partir de 1985 — ano que foi marcado por uma seca histórica, que resultou em blecautes e racionamento de água —, o horário diferenciado passou a ser adotado anualmente, com duração e abrangência territorial definidas por decretos presidenciais.

Em 2008, um decreto tornou o horário de verão permanente, vigorando do terceiro domingo de outubro até o terceiro domingo de fevereiro do ano seguinte.

Até que, em abril de 2019, o então presidente Jair Bolsonaro também por decreto extinguiu a prática.

“O horário de pico hoje é às 15 horas e [o horário de verão] não economizava mais energia. Na saúde, mesmo sendo só uma hora, mexia com o relógio biológico das pessoas”, argumentou Bolsonaro, à época.

Mas quais são as vantagens e as desvantagens da mudança de horário? Listamos alguns dos argumentos citados pelos lados contra e a favor da medida.

Argumentos a favor

Economia de energia

Com o adiantamento dos relógios em uma hora, as regiões que adotam o horário de verão ganham uma hora a mais de luminosidade no fim da tarde, adiando o acionamento de lâmpadas e eletrodomésticos na volta do trabalho para casa.

Historicamente, a economia com a medida era de cerca de 4% a 5% da demanda no horário de pico.

Ao extinguir o horário de verão em 2019, porém, o governo Bolsonaro argumentava, com base em dados do ONS, que o pico de demanda no verão mudou ao longo dos anos, do fim da tarde, para o meio dela, devido ao acionamento dos aparelhos de ar condicionado nas empresas.

Nesse cenário, a economia esperada com o horário de verão seria da ordem de 0,5% a 0,7%, mas especialistas do setor elétrico argumentam que qualquer economia é bem-vinda diante da grave seca atual e da perspectiva de rápida redução do nível dos reservatórios hidrelétricos.

“A economia de energia é sempre pouca, mas como há pouca água, qualquer economia é importante”, diz Edvaldo Santana, ex-diretor da Aneel.

Fontes eólica e solar cresceram em participação na matriz elétrica brasileira, representando 15% e 7% da capacidade de geração instalada em junho de 2024, segundo dados da Aneel

Nivalde de Castro, professor do Instituto de Economia e coordenador do Grupo de Estudos do Setor Elétrico (Gesel) da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), observa ainda que o setor elétrico brasileiro mudou desde 2019, com maior participação das fontes eólica e solar na matriz energética.

Essas fontes, que geram mais durante o dia, podem ser melhor aproveitadas com a adoção do horário de verão, diz o especialista, reduzindo a necessidade de acionamento das térmicas, que produzem energia mais cara e poluente.

“Essas duas fontes [eólica e solar] operam de maneira muito característica: venta muito de manhã e faz muito sol à tarde. Por conta disso, o sentido do horário de verão mudou radicalmente, porque hoje ele se faz necessário para que se aproveite ao máximo essas fontes”, diz Castro.

“Se antes a mudança de horário era para diminuir o consumo no pico do fim da tarde, hoje ele serviria para usar ao máximo a energia eólica e solar, preservando a água dos reservatórios. A explicação técnica é essa.”

Edvaldo Santana observa ainda que o atual nível dos reservatórios hidrelétricos – acima de 50% em todas as regiões do país – ainda é confortável.

O problema, diz o ex-diretor da Aneel, é que eles estão esvaziando cerca de 8 pontos percentuais ao mês. Assim, até o início da temporada de chuvas na região Sudeste e Centro-Oeste do Brasil, onde está a maior parte dos reservatórios de hidrelétricas do país (cerca de 70% do total), esses reservatórios podem chegar a 30% ou abaixo disso, um nível já considerado perigoso.

“É por isso que todo esforço está sendo feito para não deixar os reservatórios, que estão numa situação ainda boa, se esvaziarem”, diz Santana.

Além da possível volta do horário de verão, a Aneel acionou em setembro, pela primeira vez desde 2021, a bandeira vermelha nas contas de energia, uma forma de indicar aos consumidores através do preço que o consumo deve ser reduzido.

O ONS também poderá fazer, já neste ano, leilões para contratar reduções temporárias de consumo de energia por parte de grandes indústrias. Neste modelo, o governo busca incentivar grandes consumidores industriais a reduzir temporariamente seu consumo nos horários de pico, em troca de uma remuneração.

Mais vendas no varejo e nos bares

Uma segunda vantagem do horário de verão é o estímulo às vendas do comércio e dos bares, resultado da hora a mais de luminosidade.

“O tempo de luz natural a mais no começo da noite faz com que as ruas fiquem mais atrativas, trazendo vigor para o comércio. O movimento nos bares e restaurantes também cresce”, diz Paulo Solmucci, presidente da Associação Brasileira de Bares e Restaurantes (Abrasel).

“Por isso, estimamos um aumento de até 15% no faturamento com a mudança dos relógios, de forma que temos mais recursos circulando na economia, mais geração de empregos e a sociedade como um todo sai ganhando”, argumenta.

‘Estimamos um aumento de até 15% no faturamento com a mudança dos relógios”, diz representante do setor de bares e restaurantes

A Abrasel enviou na segunda-feira (16/9) uma carta ao ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira, com argumentos favoráveis à volta do horário de verão.

Entre os argumentos, a Abrasel citou pesquisa realizada pela associação em parceria com o site Reclame Aqui, que apontou que 54,9% das pessoas que responderam são favoráveis ao retorno do horário de verão no Brasil em 2024.

Para 16,9% a mudança é indiferente. Outros 28% se disseram contrários.

A pesquisa ouviu 3 mil pessoas e tem margem de erro de 2 pontos percentuais para mais ou para menos.

Segurança nas ruas

Um terceiro argumento em favor do horário de verão é a segurança.

“A evidência empírica sugere que uma hora a mais de luminosidade reduz homicídios, roubos e acidentes de trânsito”, disse Claudio Frischtak, sócio da consultoria Inter.B e especialista em infraestrutura, que publicou em 2019 um artigo sobre o tema em coautoria com Miguel Foguel e Renata Canini.

Estudo de 2016, realizado por pesquisadores da UFPE (Universidade Federal de Pernambuco), por exemplo, analisou dados de ocorrência de acidentes rodoviários entre 2007 e 2013. Segundo o estudo, nos Estados em que o horário de verão era adotado, houve redução de 10% dos acidentes em rodovias federais.

“Os testes revelaram que a realocação do horário de atuação da luminosidade durante o dia contribui consideravelmente na redução de acidentes em rodovias federais”, concluíram os pesquisadores.

“O impacto de transição para o horário de verão afeta o comportamento de direção dos motoristas em rodovias federais, principalmente ao entardecer.”

Exercícios físicos e uso do espaço público

Por fim, um último argumento daqueles que defendem o horário de verão é a possibilidade de fazer exercícios físicos ao fim da tarde e melhor aproveitar o espaço público.

O argumento foi usado até por Luciano Hang, dono das lojas Havan e apoiador de Bolsonaro, mas defensor da volta do horário de verão.

“Com o dia mais longo, as pessoas vivem melhor, vão às praias, praticam exercícios e têm mais qualidade de vida”, disse Hang em 2021, quando aderiu a um movimento de empresários pela volta do horário de verão.

Quem defende o horário de verão diz que ele permite aproveitar mais os espaços públicos

Argumentos contrários

Dificuldade de adaptação

O principal argumento dos contrários à volta do horário de verão é que a adaptação é difícil e a mudança mexe com o relógio biológico.

Um estudo de pesquisadores brasileiros publicado em 2017 na revista Annals of Human Biology, com mais de 12 mil participantes, mostrou que menos da metade (45,43%) diziam não sentir nenhum desconforto com a mudança de horário.

E cerca de 25% diziam permanecer desconfortáveis durante todo o período de mudança de horário.

A dificuldade de adaptação tem razões biológicas: a alteração do horário mexe com a produção de hormônios como a melatonina e o cortisol, responsáveis respectivamente por dar sono e despertar o corpo.

A mudança também é mais penosa para adolescentes, que têm dificuldade de acordar cedo para aulas matinais, e para crianças pequenas, que têm necessidade de longas horas de sono e costumam ser sensíveis a mudanças de luminosidade.

Mudanças no ciclo agropecuário

Uma segunda desvantagem do horário de verão, segundo os contrários à medida, é que ele afeta o setor agropecuário.

O gado bovino, por exemplo, é sensível à mudança de horário das fazendas, que pode inclusive afetar a produtividade leiteira.

Críticos da medida dizem que ela prejudica o setor agropecuário

“Os bovinos são animais de hábito, todos os dias eles se alimentam num mesmo horário, são animais de rotina. Se os horários mudam repentinamente, isso causa um estresse no animal. No caso da vaca de lactação, pode inclusive diminuir o leite”, disse José Carlos Ribeiro, da Boi Saúde, consultoria especializada em saúde bovina, em entrevista à BBC News Brasil em 2021.

Mas há quem trabalhe no campo e não se importe com a mudança.

“As empresas trocam o horário, em vez de pegar às 7h, pega às 8h para a colheita da soja, então não prejudica em nada, eu acho que é bom”, disse Antônio Rodrigues da Silva, presidente do Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras Assalariados Rurais de Sapezal (MT), também em entrevista naquele ano.

Horários diferentes Brasil afora

Uma terceira desvantagem é a maior dessincronia entre os horários Brasil afora.

O Brasil é um país tão grande que tem quatro fusos horários: o de Brasília, que abrange a totalidade das regiões Nordeste, Sudeste e Sul, além dos Estados do Pará, Amapá, Tocantins, Goiás e o Distrito Federal; o de Fernando de Noronha (uma hora à frente de Brasília); o do Amazonas, Roraima, Rondônia, Mato Grosso e Mato Grosso do Sul (uma hora atrás de Brasília); e o do Acre e oeste do Amazonas (duas horas atrás de Brasília).

No horário de verão, Norte e Nordeste não adotam a mudança, que não faz diferença nessas regiões devido à proximidade delas com o Equador.

Assim, no horário especial, Roraima, Rondônia e Amazonas passam a ter duas horas de diferença em relação a Brasília e o Acre, três horas.

Isso dificulta, por exemplo, a realização de eventos nacionais, a tal ponto que, em 2018, o horário de verão foi mais curto, devido às eleições.

A pedido do então presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), Gilmar Mendes, o horário de verão naquele ano começou somente em novembro, para evitar atrasos na apuração dos votos e na divulgação dos resultados.

Esta reportagem foi publicada originalmente em setembro de 2021 e atualizada com informações sobre o contexto atual em 2024.

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