Armínio Fraga: ‘No Brasil, um governo bem arrumado cresce 3%, 4%’

Ex-presidente do Banco Central do Brasil(BC), o economista Armínio Fraga é comumente associado à direita. E ele de fato é um liberal. No entanto, numa mesa da programação paralela da 21ª Festa Literária Internacional de Paraty (Flip 2023), neste sábado, ele disse que, dada à extrema desigualdade nacional, “no Brasil, quem não tem tendências de esquerda não é do bem”.

Armínio disse que está à procura de um “partido liberal, progressista e verde” para se filiar. Perguntou à plateia se alguém conhecia uma sigla com tais características. O público riu. Ele também afirmou que o Brasil precisa de juros melhores e mais investimento em infraestrutura — que pode vir da iniciativa privada, insistiu o economista.

— No Brasil, um governo bem arrumado, uma mistura de Fernando Henrique Cardoso e Lula, cresce 3%, 4% mole. Mas esse não é o atual governo. Pode vir a ser, mas acho improvável — disse. — Meu otimismo econômico se baseia no fato de que, no Brasil, há muito espaço para melhorar em todas as áreas: tanto na produtividade quanto na distribuição de renda. Isso permitiria a criação de um ciclo virtuoso. A economia funciona no gerúndio: se estiver melhorando, as coisas vão andando.

Armínio participou da mesa “Reflexões sobre o Brasil”, com o sociólogo Celso Rocha de Barros, na Casa República. Antes do debate, o economista conversou brevemente com O GLOBO e afirmou que o presidente Lula acertou ao encampar a proposta do ministro da Fazenda, Fernando Haddad, em defesa do déficit zero em 2024, apesar da descrença do mercado, que duvida que o cumprimento da meta seja factível.

No entanto, Armínio faz um esclarecimento. O governo defende o déficit primário zero, isto é, o equilíbrio entre despesas e receitas, mas continua “fazendo empréstimo para pagar juro”.

— Isso requer estratégia, não dá para pagar juro sempre, mas isso nem entrou no radar do governo, porque esse tema é escondido pela retórica do déficit zero — disse Fraga. — Mais importante do que manter o número do arcabouço fiscal são as defesas que ele dispara para que a meta seja cumprida. Sou uma pessoa de viés conservador no lado fiscal, no resto não. Mudar a meta traria um certo alívio e evitaria tomar providências, mas manter a meta é uma boa escolha. O arcabouço fiscal inclui mecanismos saudáveis de correção de rota. Não são suficientes, não vão resolver tudo, mas representam uma guinada na direção correta. O país estava sem âncora nenhuma, rumando para uma direção complicada.

Armínio ainda deu um palpite fora de seu “habitat”: a briga entre o Supremo Tribunal Federal (STF) e o Congresso, que tenta limitar as decisões monocráticas dos ministros da Corte.

— Algumas dessas propostas fazem sentido, porque há excessos de decisões monocráticas e pedidos de vista. A discussão é saudável. O problema é que estamos em um momento muito tenso, em que essa discussão é vista como um ataque institucional — afirmou.

‘Reflexões sobre o Brasil’

Na mesa da Casa República, Armínio e Celso Rocha de Barros discutiram os dilemas do país. O ex-presidente do BC disse que não está tão pessimista. E o autor de “PT, uma biografia” (Companhia das Letras) afirmou que o Brasil precisa de partidos fortes.

— É muito ruim que o PSDB tenha entrado em crise. Não vejo um concorrente a ele na centro-direita que esteja inserido nos debates e com gente que participou da luta contra a ditadura — afirmou Barros. — A microrreforma eleitoral de 2017 já diminuiu o número de partidos. O problema é que essa reforma foi feita no auge do Centrão. Os partidos brasileiros vão se consolidar, mas tenho sérias dúvidas de que serão os partidos que a gente gostaria, que sejam ideológicos e se convertam ao centro.

Barros disse ainda que a classe política brasileira nunca foi tão parecida com o que era na época da ditadura: conservadora e “pouco permeável à discussão ideológica”.

Governo lança 187,5 mil unidades do Minha Casa Minha Vida

O governo federal lançou, nesta quarta-feira (22/11), a 1ª Seleção de Propostas para o Minha Casa Minha Vida. Durante cerimônia no Palácio do Planalto, com a presença do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), o governo anunciou que vai iniciar a construção de mais de 187,5 mil unidades habitacionais para a chamada Faixa 1 do programa, ou seja, para famílias com renda até dois salários mínimos (R$ 2.640,00).

Ao todo, serão mais de 1.200 novos empreendimentos, divididos em 560 municípios. O governo estima que a construção movimentará cerca de 500 mil empregos, diretos e indiretos. A seleção foi feita com base em propostas enviadas por estados, municípios e construtoras. Segundo o ministro das Cidades, Jader Filho, as sugestões somaram mais de 900 mil unidades.

“Esta é só a primeira seleção. Ainda teremos as de 2024, 2025 e 2026”, discursou Jader. “Não tenho a menor dúvida em afirmar que esse é o maior programa habitacional da história. Não só do Brasil, mas um dos maiores programas habitacionais do mundo. A nossa meta até 2026 é a contratação de mais 2 milhões de unidades habitacionais, e aqui vou afirmar meu otimismo que nós vamos superar a meta que o senhor determinou”, acrescentou ainda o ministro, dirigindo-se a Lula.

Segundo o chefe da pasta, o governo já entregou neste ano 21 mil casas construídas com recursos da União, e retomou 35 mil obras que estavam paradas no governo passado. Ele destacou ainda os novos critérios para moradias do programa, que consideram a localização, a qualidade da infraestrutura, e a presença de espaço para biblioteca nos condomínios e varandas nas unidades. Além disso, Jader anunciou que o governo abrirá uma seleção exclusiva de projetos para municípios com menos de 50 mil habitantes.

Em paralelo com o anúncio da seleção, Jader assinou acordo de cooperação com a Academia Brasileira de Letras (ABL) para construir um acervo de livros doados pela academia para as bibliotecas do programa Minha Casa Minha Vida. O ministro também anunciou o Prêmio Minha Casa Minha Vida, que celebrará os empreendimentos mais inovadores, sustentáveis e de maior qualidade do programa.

Lula quer classe média no Minha Casa Minha Vida

O presidente Lula, por sua vez, destacou a importância da cooperação com parlamentares e com os governos estaduais para o andamento dos programas sociais. Ele citou que, quando criou o Minha Casa Minha Vida, havia um déficit habitacional no Brasil de 7 milhões de casas, que ainda não foi sanado. O programa já entregou, desde sua criação, 6 milhões de unidades.

“Esse programa provou que, quando a gente quer, as coisas acontecem. Você tem gente que quer casa, oportunidade de ter dinheiro, empresários que sabem fazer. O maior sonho do povo pobre nesse país é ter uma casa própria”, afirmou. Lula reforçou ainda que quer a inclusão da “Faixa 4” no programa, que atenda a classe média, com renda mensal de R$ 8 mil a R$ 10 mil. Jader, por sua vez, disse que a pasta está estudando a possibilidade “com carinho”.

Também participaram da solenidade o vice-presidente e ministro do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços, Geraldo Alckmin (PSB), o ministro da Casa Civil, Rui Costa, o presidente da Caixa Econômica Federal, Carlos Vieira, além de governadores e parlamentares.

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BNDES e Vale terão fundo de investimentos para minerais críticos com foco em veículos elétricos , diz Mercadante

O presidente do BNDES, Aloizio Mercadante, disse nesta quarta-feira que a instituição trabalha em parceria com a Vale para o lançamento de um fundo para o investimento em minerais críticos.

Na avaliação do executivo, um dos maiores desafios do Brasil em relação ao processo de transição energética é a agregação de valor aos produtos. Ele citou o exemplo da indústria de ônibus do país que, segundo ele, produz 52% dos veículos que circulam na América Latina, mas que seguem movidos a diesel.

– Ou migramos para o ônibus elétrico ou vamos perder esse mercado e essa história. Temos um gigantesco poder de compra, um mercado interno muito forte, uma rede de distribuição e uma presença na região

Segundo Mercadante, o BNDES está financiando projetos para gerar maior valor agregado para as baterias produzidas no Brasil. A parceria com a Vale ajudaria nesse processo. O presidente do banco não deu detalhes sobre valores e prazos dos investimentos.

– Nós somos a quarta indústria de lítio, e vamos lançar um programa especial com a Vale em minerais críticos, que nos interessa muito sair na frente. Não é só produzir o mineral, mas agregar valor no Brasil com essa indústria de ônibus elétricos

De acordo com o executivo, a instituição ajudou a financiar 1.300 ônibus elétricos que circulam na cidade de São Paulo, com investimento de R$ 2 milhões.

Segundo Eduardo Bartolomeo, presidente da Vale, a empresa busca triplicar sua produção de cobre e dobrar a de níquel, minerais usados em baterias de carros elétricos. Ele ressaltou a venda da fatia do negócio de metais básicos da Vale para empresas árabes em julho. Pelo acordo, a Manara Minerals e a Engine No. 1 pagariam US$ 3,4 bilhões, passando a deter 13% da Vale Base Metals (VBM).

— A cisão do nosso negócio de metais básicos vai falar de transição energética mais diretamente. A demanda de níquel, cobre, cobalto e nióbio e de todos os minerais críticos é presente e real. Segmentamos o negócio e trouxemos parceiros para dar foco nisso. O nosso parceiro de classe mundial validou uma tese de valor muito relevante — afirma.

Inteligência artificial

Mercadante ainda destacou a importância do investimento em inteligência artificial por parte de empresas. O banco lançou uma linha de crédito para o segmento de R$ 2 bilhões.

– Empresas que não usarem inteligência artificial não serão competitivas no futuro. É uma exigência utilizar a inteligência artificial para ganha eficiência e ter respostas personalizadas para ter capacidade de previsão futura. As grandes empresas que estão se impondo no mercado vêm com essas bagagens e esses investimentos.

Mercadante disse que o banco e o Fundo Amazônia vão lançar projetos voltados para reflorestamento da Amazônia e buscam parceiros internacionais para isso.

– A primeira vantagem competitiva que o Brasil tem é que temos 25% de florestas tropicais. A única resposta imediata e urgente e capaz de sequestrar carbono é impedir o desmatamento e reflorestar parte do território da Amazônia.

Ainda assim, Mercadante ponderou que não é viável a substituição imediata do uso de fontes de energia baseadas em combustíveis fósseis. Dessa forma, seria necessário acelerar a transição energética.

O executivo defendeu a atuação do banco em operações de captação de recursos por parte de empresas no mercado. Após o escândalo da Americanas, o mercado de emissões de títulos de crédito privado sofreu forte retração no primeiro trimestre, com redução do número de emissões e aumento dos spreads.

O cenário começou a melhorar em junho, com o lançamento de emissões incentivadas, voltadas para projetos de infraestrutura. O BNDES atuou em algumas operações, o que garantiu maior demanda e redução das taxas pagas pelas empresas.

Segundo Mercadante, a atuação em operações do tipo pelo BNDES vai continuar.

– Na área de estrutura, depois da Americanas, tivemos uma aversão ao risco no Brasil e o BNDES entrou para alavancar o mercado de capitais. Temos visto algumas vozes no mercado, reclamando que o BNDES entrou, mas se não entrássemos, não saía. Fizemos as duas maiores emissões de infraestrutura na história. (…) O ‘B’ de BNDES é de banco e não de bobo.