Zhu Qingqiao, embaixador da China: “Nossa relação é de longo prazo”

Brasil e China completam, este ano, 50 anos de relações diplomáticas, além dos 20 anos da Comissão Sino-Brasileira de Alto Nível de Concertação e Cooperação (Cosban) — instalada em 2004, quando o Brasil reconheceu o país asiático como uma economia de mercado e criou o colegiado para fomentar discussões entre os dois governos. Desde então, as nações apenas estreitaram os laços no campo comercial, apesar de tensões diplomáticas em alguns governos, como no de Jair Bolsonaro.

Em conversa com o Correio, o embaixador da China no Brasil, Zhu Qingqiao, ressaltou que os dois países são as maiores nações em desenvolvimento em seus respectivos hemisférios. Afirmou, ainda, que o Brasil sempre esteve entre os primeiros a firmar parcerias estratégicas com os chineses. Para o futuro, ele espera uma aproximação ainda maior em temas como economia verde e reindustrialização.

Qingqiao citou como exemplo a Iniciativa Cinturão e Rota (ICR), um projeto global de investimentos chineses em infraestrutura, ao qual o Brasil optou por não aderir oficialmente até agora — apesar de os primeiros convites virem em 2018.

O embaixador participou, ontem, do evento “50 anos da Relação Brasil-China: Cooperação para um Mundo Sustentável”, em Brasília, realizado pelo Centro Brasileiro de Relações Internacionais (Cebri) e pela Academia Chinesa de Ciências Sociais (CASS). O presidente em exercício, Geraldo Alckmin, também participou do encontro e celebrou o marco diplomático.

“O melhor resultado da parceria Brasil-China é o comércio exterior. Ele é campeão. Hoje, a China é o maior parceiro comercial brasileiro, com fluxo superior a US$ 150 bilhões de dólares, e crescente”, frisou.

Também estavam presentes a senadora e ex-ministra da Agricultura Tereza Cristina (PP-MS), o embaixador Eduardo Paes Saboia — secretário de Ásia e Pacífico do Ministério das Relações Exteriores —, o presidente do Cebri, José Pio Borges, e o vice-presidente da Confederação Nacional da Agricultura e Pecuária (CNA), Gedeão Pereira. Confira a entrevista.

Qual a importância, para a China, dessas últimas cinco décadas de relacionamento com o Brasil?

O marco de 50 anos de relações diplomáticas é muito importante. China e Brasil são os maiores países em desenvolvimento, respectivamente, nos hemisférios Leste e Oeste. Temos uma tarefa em comum, que é o desenvolvimento, a construção dos dois países. E, na economia, temos muita complementaridade.

A data também marca os 20 anos de criação da Cosban, que aprofundou a parceria. O que mudou nestas duas décadas?

Nesses 20 anos, nós, os dois países, sempre encaramos essa relação do ponto de vista estratégico. E o Brasil é o primeiro país (em desenvolvimento) a estabelecer parceria estratégica com a China (em 1993). E também o primeiro país na América Latina a estabelecer essa relação de parceria estratégica global com a China (em 2012). Isso mostra que nossos países sempre encararam essa relação do ponto de vista de longo prazo.

Apesar das aproximações e afastamentos promovidas por diferentes governos brasileiros, a parceria se manteve firme todo esse tempo…

Conseguimos passar por diferentes períodos, mas sempre o Brasil estava lá. Há 14 anos a China é o maior parceiro comercial do Brasil, e também é o maior mercado para exportação do Brasil. Estamos muito contentes e com vistas aos próximos 50 anos.

Dá para prever o que vem pela frente?

Vamos fazer um resumo, tirar a experiência — uma boa experiência — e olhando para frente como um futuro compartilhado para ambos os países, aproximando ainda mais essas relações e, também, fazendo essa sinergia da estratégia de desenvolvimento dos países. Como, por exemplo, a Iniciativa Cinturão e Rota e os projetos do Brasil de reindustrialização, de transformação ecológica. Temos muitas áreas para explorar — ciência, tecnologia e inovação, economia verde, economia digital. Por isso, podemos ter um futuro muito promissor.

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Pirataria e contrabando causam prejuízo de R$ 453 bi por ano no Brasil

A escolha por comprar produtos falsificados pode parecer atrativa para quem vê apenas por fora. Apesar disso, essa opção “barata” pode, por muitas vezes, sair bem mais caro no final. Diante disso, uma pesquisa conduzida pela Confederação Nacional da Indústria (CNI) revelou o tamanho dos prejuízos para a sociedade, bem como para o poder público e o setor privado, causados pela prática da ilegalidade no país.

A pesquisa Brasil Ilegal, que também contou com a parceria da Federação das Indústrias do Estado do Rio de Janeiro (Firjan) e da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), revela que o Brasil deixa de arrecadar pelo menos R$ 453 bilhões todos os anos. Esse valor equivale a cerca de 4% do Produto Interno Bruto do país no ano passado.

“Esse valor é, realmente, um desastre nacional. Ele atinge todo cidadão, atinge os governos municipais, atinge os governos estaduais, e atinge a União. E, na verdade, são recursos que equivalem a todo o PIB de Santa Catarina. São recursos que vão para o ralo, pois são impostos que deixam de entrar nos cofres públicos”, afirma o diretor da Fiesp e da Firjan na área de segurança, Carlos Erane de Aguiar.

Para chegar a esse valor bilionário, foram contabilizados somente 16 setores da economia. Por conta disso, os responsáveis pelo estudo acreditam que esse valor pode ser ainda maior.

“Então toda a sociedade deve ter essa consciência de que quando adquire um produto ilegal ou pirata, todos perdem. São empregos que deixam de ser gerados em todo o país. Esse prejuízo financeiro poderia ser revertido em investimento em escolas, hospitais e segurança, principalmente, que é um tema, hoje, do Brasil, que está muito carente”, completa o diretor.

De acordo com o Índice Global de Crime Organizado, publicado em 2022, o Brasil é o 22º país com o pior índice de criminalidade no que tange ao comércio de produtos falsificados, e fica atrás apenas de Colômbia (2º), Paraguai (4º) e Equador (11º) na América do Sul.

Ao destrinchar o ônus total para o país (R$ 453 bi) com a ilegalidade, a CNI calcula que R$ 136 bilhões equivalem a impostos que deixaram de ser arrecadados, enquanto que R$ 297 bilhões foram perdidos ao considerar os 16 setores econômicos avaliados pela pesquisa. Além disso, o restante do valor integra os furtos de energia e água.

Segundo o gerente de infraestrutura da Federação das Indústrias do Rio de Janeiro (Firjan), Isaque Ouverney, o valor perdido com o furto de energia no país no ano passado é equiparado ao abastecimento de toda a região metropolitana de São Paulo por um ano. “A gente perde aqui valores que são cada vez maiores em termos de energia, em termos de água e esgoto, que são perdidos aqui todos os anos”, comenta.

De acordo com a pesquisa, somente os chamados ‘gatos’ (ligações clandestinas) de energia custaram R$ 6,3 bilhões ao país em 2022. Como explica a CNI, o valor poderia ser utilizado em novos investimentos no setor, além da melhoria da qualidade do serviço no país, que tem sido alvo de críticas mais rotineiras este ano, como o caso dos apagões em São Paulo, por exemplo.

No caso do abastecimento de água, dados disponibilizados pelo Sistema Nacional de Informações sobre Saneamento (SNIS) estimam que as ligações irregulares nas redes de abastecimento do Brasil causaram prejuízo de R$ 14 bilhões aos cofres públicos no ano retrasado. Para se ter ideia, o volume total de água desviado por ano no país equivale a 2,6 vezes o volume do Sistema Cantareira.

Além de ser prejudicial aos governos, essas práticas ilegais também causam danos a toda a sociedade, como explica o gerente de infraestrutura da Firjan. “Quando a gente olha para o setor de infraestrutura, a gente vê que são recursos que estão sendo drenados de potenciais investimentos para a expansão do sistema, principalmente quando a gente fala em termos de saneamento, que é um desafio brasileiro, e também recursos que poderiam ser destinados para a redução das tarifas”, pontua Ouverney.

A pesquisa da CNI também mostra que, nos 16 setores analisados, o mercado ilícito brasileiro foi responsável pela perda de cerca de 370 mil empregos diretos com carteira assinada em 2022. Nesse sentido, o setor que mais foi afetado foi o de vestuário, com 67 mil postos de trabalho a menos.

Outros setores, como o farmacêutico e o de combustíveis, também deixaram de empregar 20,7 mil e 15,5 mil trabalhadores, respectivamente, por conta desse mercado informal. “Então são oportunidades de desenvolvimento em regiões que necessitam, muitas vezes, regiões que estão carentes, que deixam de acontecer, por conta do mercado ilegal”, avalia, ainda, o gerente de infraestrutura.

Apesar de parecer vantajosa à primeira vista, a opção de comprar um produto ou adquirir um serviço de maneira ilegal pode causar sérios transtornos ao cliente. Além do prejuízo financeiro com a compra de itens de qualidade inferior, há também perigos para a saúde. Como ressalta a advogada da Kasznar Leonardos, Raquel Barros, produtos irregulares não passam por controles de qualidade adequados, e podem conter substâncias tóxicas ou prejudiciais.

“Por exemplo, eletrônicos falsificados podem apresentar risco de incêndio ou explosão devido a falhas na fabricação; calçados falsificados podem causar danos às articulações; óculos de sol falsos podem prejudicar a retina. Além disso, há o risco de intoxicação decorrente do consumo de bebidas falsificadas, medicamentos, cosméticos, entre outros”, alerta a jurista.

Para evitar cair nesses enganos, o consumidor deve ficar atento a alguns aspectos. Segundo a advogada, o principal é conferir a origem e o preço do item a ser comprado. “Com o fácil acesso à internet, o consumidor pode verificar os preços praticados pelas lojas oficiais e deve desconfiar sempre que um item for vendido por um valor significativamente abaixo do praticado pela loja oficial”, esclarece a advogada Raquel Barros.

Além disso, também é recomendável comprar de lojas ou vendedores confiáveis e reconhecidos no mercado, como aconselha o advogado especializado em direito do consumidor e sócio no Machado de Carvalho Advocacia, Mozar Carvalho.

“(É necessário) verificar a autenticidade dos produtos, procurando por selos de autenticidade, códigos de barras e outras características que comprovem a originalidade do produto, é essencial. Além disso, preços muito baixos, especialmente em relação a produtos de marcas conhecidas, podem indicar que o produto é falsificado ou contrabandeado”, recomenda.

Caso o consumidor deseje prestar queixa contra vendedores que anunciam produtos falsificados ou contrabandeados, é possível fazer uma reclamação formal às autoridades competentes, entrando em contato com órgãos de defesa do consumidor, como o Procon, ou com a polícia. Como explica o advogado, é recomendável dar a maior quantidade possível de detalhes sobre o vendedor e o produto em questão.

“É importante fornecer o máximo de informações possíveis, como nome, endereço, site ou perfil nas redes sociais do vendedor, juntamente com evidências que comprovem a venda de produtos ilegais. Dessa forma, as autoridades poderão investigar e tomar as medidas necessárias para combater essas práticas ilegais”, explica o advogado Mozar Carvalho.

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Isenção do IR deve ser informação pública, como salário de servidor, diz autor de novo livro sobre desigualdade

Se qualquer um pode ver o salário de cada servidor público ou os valores recebidos por beneficiários do Bolsa Família – ambos nominalmente – no Portal da Transparência do governo federal, por que não é possível ver o quanto alguém está sendo isentado de pagar impostos, ou pelo menos saber a alíquota efetiva que um grande empresário ou um artista está pagando?

A provocação é do economista Pedro Fernando Nery, em seu novo livro Extremos: Um mapa para entender as desigualdades no Brasil, que chega às livrarias nesta terça-feira (16/4) pela Zahar/Companhia das Letras.

No livro, Nery visita oito destinos do Brasil que marcam extremos de desigualdade e discute reformas possíveis para mudar esse quadro.

“Por que o sigilo fiscal de alguém muito rico é tão mais valioso do que a privacidade de uma dona de casa na periferia de São Paulo, por exemplo?”, questiona Nery, em entrevista à BBC News Brasil.

“Uma parte fundamental dessa questão da tributação da renda é conseguirmos aplicar os princípios da Lei de Acesso à Informação, que já vale para a despesa [direta do governo], também para a despesa indireta. Quer dizer, para todas as isenções e benefícios [tributários].”

Para o economista, ampliar o acesso à informação seria uma forma de reduzir resistências para a realização de reformas difíceis – como a aguardada reforma do Imposto de Renda (IR), que deve aumentar a taxação dos mais ricos, tornando o tributo mais progressivo (ou seja, fazendo quem tem mais pagar mais).

Em março, o governo adiou o envio da proposta de reforma do IR ao Congresso, gerando o temor de que ela possa ser deixada de lado.

Consultor legislativo do Senado de carreira, e atualmente diretor de Assuntos Econômicos e Sociais da Vice-Presidência da República, trabalhando na equipe de Geraldo Alckmin, Nery considera o adiamento justificável, devido ao ano de eleições municipais e à necessidade de regulamentação da reforma tributária do consumo.

“Não podemos correr o risco de ter uma reforma da renda como aquela que foi discutida no Congresso no governo anterior, que estava, segundo muitos especialistas, saindo pior do que entrou”, diz, citando a proposta de reforma apresentada pelo ex-ministro da Economia Paulo Guedes, que não prosperou.

Num momento em que o governo federal cancela eventos para rememorar os 60 anos do golpe de 1964 para não desagradar os militares, Nery defende uma outra reforma polêmica: a da Previdência das Forças Armadas.

“Gastamos com pensão de inatividade militar algo como R$ 50 bilhões por ano”, diz.

“Se olharmos para o orçamento pré-pandemia do Bolsa Família, que estava ao redor de R$ 30 bilhões, vemos que gastávamos quase o dobro com proteção à renda das famílias militares, do que com proteção à renda das famílias pobres”, argumenta.

Entusiasta da expansão do Bolsa Família – cujo orçamento chegou a inéditos R$ 170 bilhões em 2024 –, Nery acredita que é preciso agora dar o próximo passo.

Ele defende a criação de um Benefício Universal Infantil, para todas as crianças do país, sejam elas ricas ou pobres.

O modelo tem sido tema de estudos diversos do Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada) nos últimos anos, e é adotado em países que são exemplo de igualitarismo, como a Finlândia.

“A universalização faz sentido em um país como o Brasil, em que os mais ricos já recebem um benefício do governo, que é o benefício por dedução do Imposto de Renda”, afirma.

“Estamos falando de um modelo em que os mais ricos não receberiam mais do que já recebem, mas grupos intermediários e pobres receberiam mais do que hoje.”

Economista liberal de formação – doutrina que rejeita o intervencionismo do Estado na economia –, mas atualmente parte de um governo de esquerda, Nery acredita que a desigualdade é um tema que pode ajudar a criar consensos num país polarizado.

“No Brasil, temos uma tradição de ter um apoio multipartidário para esses temas”, afirma.

“Veja, por exemplo, na ampliação do Bolsa Família ou no Auxílio Emergencial, que foram temas consensuais no Congresso, mesmo com toda a polarização.”

Ele, no entanto, evita se posicionar no espectro político.

“Eu me acostumei tanto a trabalhar para esquerda e para a direita no Senado, e a ser xingado pelos dois lados quando eu era colunista no Estadão, que não me preocupo tanto com isso”, desconversa.

“Dependendo do que eu escrevia no jornal, me chamavam de ‘liberal planilheiro’ ou de ‘comunista maconheiro’. Então o que me motiva é olhar a ciência, a realidade, a experiência internacional e não pensar tanto em ideologia. Até porque, às vezes, isso divide mais do que conquista.”

Confira abaixo os principais trechos da entrevista.

BBC News Brasil – No seu livro, você conduz o leitor por oito locais do Brasil que marcam extremos de desigualdade e descreve-os como “lugares que tecnocratas como eu somente imaginam a partir de dados do IBGE”. Qual desses oito locais que você visitou te impressionou mais e por quê?

Pedro Fernando Nery – O que mais me impressionou foi a realidade de Ipixuna [município no sudoeste do Amazonas, às margens do rio Juruá e ao sul do Vale do Javari].

É o lugar menos desenvolvido do Brasil, mas ele impressiona mesmo pelo isolamento geográfico. É um lugar de muito difícil acesso.

Ao mesmo tempo, temos falado tanto de mudança climática, de conservação, e acredito que ainda não amadurecemos o debate sobre trazer soluções viáveis para essas populações que moram no interior da Amazônia.

Algo que discuto no livro é a possibilidade de ampliar transferências de renda, que é algo que me parece mais factível do que tentar desenvolver alguma atividade econômica que seja compatível com a preservação da floresta, diante dessa escassez de infraestrutura.

Estamos falando de cidades que não estão ligadas por terra a nenhum outro lugar. Que só podem ser acessadas por rio ou pelo céu. E com dificuldades específicas para esse acesso em cada época do ano.

Então, penso que precisamos olhar com mais carinho e com mais realismo para essa realidade da pobreza na Amazônia.

BBC News Brasil – No livro, você enfatiza a solução da transferência de renda, do tipo Bolsa Floresta [atualmente “Guardiões da Floresta”, programa do governo do Amazonas que paga R$ 100 por família para 15 mil famílias que moram em unidades de conservação]. Como compatibilizar isso com o desejo das pessoas que vivem na região amazônica de trabalhar?

Nery – Penso que a transferência de renda, além de aliviar a pobreza, fomenta o consumo e o próprio mercado local.

Mas acredito que tem talvez uma bola quicando aí, uma solução possível, que é investirmos mais em economia de serviços, que tem uma pegada ambiental baixa e não depende tanto de infraestrutura, de escoamento, quanto a indústria, o agro e a mineração.

Então acredito que essas novidades que estão surgindo em relação à telecomunicação, à internet, a Starlink [serviço de internet por satélite oferecido por empresa do bilionário Elon Musk], são soluções que temos que considerar.

Nas grandes cidades, o que queremos para os nossos filhos é que eles sejam médicos ou outras profissões ligadas ao setor de serviços.

Então acredito que podemos perder o que a gente chama no jargão de “fetiche da mercadoria” e pensar mais em economia de serviços como uma solução que compatibilize preservação ambiental e o desejo por inclusão produtiva que você mencionou.

BBC News Brasil – Ao longo da sua jornada, você apresenta uma série de reformas que podem tornar o Brasil mais igualitário, sendo a primeira delas a reforma do Imposto de Renda, que nos cálculos do Ipea pode gerar ganhos de até R$ 120 bilhões por ano. No entanto, em março, o governo federal decidiu adiar o envio dessa reforma ao Congresso. Como você avalia esse adiamento?

Nery – Acredito que o presidente Lula colocou de uma forma inequívoca, ainda nas eleições, o imperativo de colocar o pobre no Orçamento e o rico no Imposto de Renda.

Isso foi feito já no primeiro ano de governo, com a restrição a Juros sobre Capital Próprio [modalidade de distribuição de lucros que permitia às empresas pagar menos impostos], a taxação dos fundos fechados e offshore e a mudança de regras para letras de crédito.

Mas, de fato, ainda precisamos de uma reforma mais ampla da tributação da renda.

Por esse ser um ano de eleição municipal e ainda termos como prioridade a regulamentação da reforma tributária do consumo, através de projetos de lei complementar, me parece que o adiamento faz sentido.

Porque não podemos correr o risco de ter uma reforma da renda como aquela que foi discutida no Congresso no governo anterior, que estava, segundo muitos especialistas, saindo pior do que entrou.

Então acredito que, para chegar no Congresso com uma proposta mais madura, e também não tumultuar a regulamentação da reforma tributária do consumo, faz sentido o adiamento.

Mas acredito que há um compromisso muito claro do presidente, que fica evidente nesse slogan “pobre no Orçamento, rico no Imposto de Renda”.

BBC News Brasil – Mas há o risco de a reforma do Imposto de Renda não sair no governo atual? E como você vê essa possibilidade, seria algo muito ruim?

Nery – Eu sinceramente não vejo isso acontecendo e espero que não aconteça.

Claro que não tenho procuração para falar em nome do governo, mas acredito que existe um compromisso muito claro de trazer esse tema.

E, de fato, em termos de combate à desigualdade, [o governo] ficaria devendo [sem uma reforma do Imposto de Renda].

A gente teve uma ampliação importante do Bolsa Família nesse governo, que basicamente quintuplicou o orçamento, o que deve estar tendo um impacto intergeracional tremendo neste momento. Mas temos que lutar para conseguir olhar sim para o lado da arrecadação.

E eu penso que, por parte do próprio Parlamento, existe abertura para esse tema da tributação da renda. Se olharmos que já houve inclusive o envio de um projeto de reforma do IR] no governo anterior, com embates públicos do ministro [da Economia do governo Bolsonaro] Paulo Guedes.

Vemos que existe alguma convergência nesse ambiente tão polarizado quanto a essa necessidade de que os ricos paguem mais imposto.

BBC News Brasil – Ainda no tema da renda, no mês passado o economista francês Gabriel Zucman – um grande defensor da tributação de grandes riquezas – esteve no Brasil a convite do ministro da Fazenda, Fernando Haddad. A passagem dele pelo país causou burburinho entre economistas brasileiros, devido a um acordo fechado com a Receita Federal para acesso a dados para pesquisa. Qual a importância dos dados da Receita para os estudos sobre desigualdade e como você viu as críticas ao acordo entre o órgão e um pesquisador estrangeiro?

Nery – Os dados são fundamentais. Eu não conheço os detalhes desse acordo do professor Zucman com a Receita, mas algo que defendo no livro, que talvez até pareça radical para alguns leitores, é que deveríamos ter uma transparência muito maior dos dados da Receita.

E não digo isso só em relação a acadêmicos, digo em relação à sociedade civil como um todo.

Veja, se você entrar agora no Portal da Transparência, você vai encontrar [os dados de] uma mãe beneficiária do Bolsa Família lá.

Com um clique, você vê todos os valores que ela já recebeu, pode ver se o valor que ela recebe por dependente aumentou num determinado mês, o que indica que ela teve um novo filho.

E tem até um botão, que já aparece logo abaixo, que permite que você denuncie o possível recebimento ilegal do benefício, que às vezes foi de, sei lá, R$ 100.

Então, se eu consigo, em poucos segundos, saber quanto uma pessoa recebe de valores quase irrisórios do governo, eu deveria ter um tipo de transparência equivalente para a pessoa que recebe do governo valores muito maiores, mas recebe indiretamente por meio do sistema tributário.

Então uma provocação que faço no livro é que, se é possível ver a remuneração dos servidores públicos no Portal da Transparência, por que eu não posso ver o quanto alguém está sendo isentado de pagar impostos, ou pelo menos saber a alíquota efetiva que um grande empresário ou um artista está pagando?

Acho que isso fomentaria o debate e, em termos da lógica jurídica, não vejo muita diferença.

Por que o sigilo fiscal de alguém muito rico é tão mais valioso do que a privacidade de uma dona de casa na periferia de São Paulo, por exemplo?

Acredito que uma parte fundamental dessa questão da tributação da renda é conseguirmos aplicar os princípios da Lei de Acesso à Informação, que já vale para a despesa, também para a despesa indireta. Quer dizer, para todas as isenções e benefícios [tributários].

BBC News Brasil – Mas, especificamente sobre as críticas ao acordo Receita-Zucman, você acredita que os economistas brasileiros têm um ponto, de quererem também ter acesso a esses dados?

Nery – Francamente, acho que sim. Os pesquisadores brasileiros deveriam ter o mesmo nível de acesso que um pesquisador estrangeiro. Sem saber detalhes da polêmica, eu acho que isonomia faz todo sentido.

BBC News Brasil – Outra mudança defendida no livro é a continuidade da reforma da Previdência e você destaca particularmente que uma lacuna da reforma de 2019 diz respeito às Forças Armadas. Quais são hoje os principais problemas na Previdência dos militares e por que isso afeta a desigualdade do país?

Nery – Afeta porque consome uma parte muito relevante do gasto. Gastamos com pensão de inatividade militar algo como R$ 50 bilhões [por ano].

Se olharmos para o orçamento pré-pandemia do Bolsa Família, que estava ao redor de R$ 30 bilhões, vemos que gastávamos quase o dobro com proteção à renda das famílias militares, do que com proteção à renda das famílias pobres.

Então isso é uma questão já de desigualdade na apropriação dos recursos. E existe uma questão, acho que mais evidente, que é a desigualdade no acesso aos benefícios.

Temos a história da pensão por morte ficta, que é aquela quando o militar comete alguma transgressão, é expulso, e ele perde direito à pensão de aposentadoria.

Mas, se ele for casado, a mulher dele tem direito à pensão. Fica equiparada a expulsão à morte dele. Isso não existe em nenhum outro lugar.

Ou o próprio valor da pensão por morte para os servidores [militares].

Para o pessoal do INSS, temos aquele cálculo proporcional, que foi tão polêmico desde 2015, de 60% do benefício, mais 10% por dependente. Enquanto os militares continuam tendo 100%.

Então, esse é um caso em que vemos uma desigualdade mais evidente, um tratamento mais vantajoso [para os militares].

BBC News Brasil – E você vê espaço para uma reforma mais ampla da Previdência das Forças Armadas em algum futuro próximo, sendo que o governo federal desistiu até de promover cerimônias para rememorar os 60 anos do golpe de 1964 para não desagradar os militares?

Nery – Eu acredito que existe espaço no Parlamento, principalmente se fizermos esse debate com serenidade, sem nenhum desejo de revanche, nem nada assim.

Se olharmos para o que foi feito em 2019 na reforma [da Previdência] dos militares, algumas coisas boas foram feitas.

O tempo mínimo de serviço foi elevado, de 30 para 35 anos. Passou a haver tributação das pensionistas, que não existia.

A alíquota de contribuição foi aumentada em quase 30%. As idades de limite para aposentadoria em cada patente foram ampliadas.

Então acho que existe algum espaço para diálogo, para tratar desse sistema de uma maneira que seja justa e não como algum tipo de retaliação por uma associação maior de parte das Forças a um determinado grupo político.

Acredito que é uma questão que dá para ser olhada com tranquilidade.

BBC News Brasil – Você destacou que o Bolsa Família atingiu um orçamento sem precedentes neste terceiro governo Lula. São quase R$ 170 bilhões, ante cerca de R$ 30 bilhões antes da pandemia. Na sua avaliação, esse orçamento é sustentável à frente? E como conciliar esse valor já elevado com outras demandas, como o reajuste periódico do benefício pela inflação?

Nery – Eu acho que ele deveria ser sustentável e, por mim, poderia ser até maior.

Considerando que a despesa total [do governo] está em cerca de R$ 2 trilhões, estamos falando de um “Super Bolsa Família” que ainda não consome 10% do Orçamento federal e não consome nem 2% do PIB do país.

Então, para um programa tão discutido, que já foi tão polêmico, é importante trazermos essa realidade.

Agora, de fato a questão do desenho é um desafio. E é algo que eu discuto no livro, que deveríamos mirar numa proteção mais universal para a infância, caminhar no sentido de uma renda universal [infantil].

O governo tem feito ajustes importantes em combater aquele excesso que houve [no acesso ao Bolsa Família] no governo anterior, em relação às famílias unipessoais, formadas por uma só pessoa.

Mas penso que talvez devêssemos ser mais ambiciosos e ter um Bolsa Família para todas as crianças, um Benefício Universal Infantil, como tantos países desenvolvidos têm.

E como a gente poderia ter, principalmente quando levamos em conta que muitas crianças que não recebem Bolsa Família estão na metade mais pobre da população

Acho que é importante lembrarmos disso: ainda tem muita gente fora do Bolsa Família, frequentemente famílias que não são cronicamente pobres, mas que num mês está tudo bem, no próximo acontece uma tragédia ambiental, um acidente, uma doença, que podem jogar elas para a pobreza.

BBC News Brasil – Você pode explicar melhor o que é e como poderia funcionar esse Benefício Universal Infantil? Ele seria um substituto ao Bolsa Família ou algo que existiria em paralelo?

Nery – O Benefício Universal Infantil é uma ideia relativamente simples.

É a ideia de que toda criança merece proteção estatal, porque as famílias com crianças são mais vulneráveis à pobreza. Fundamentalmente, pela necessidade de ter um cuidador que vai estar, pelo menos parcialmente, fora do mercado de trabalho, ou com uma carga horária reduzida.

No mundo todo, famílias com crianças são mais vulneráveis à pobreza.

E a universalização faz sentido em um país como o Brasil, em que os mais ricos já recebem um benefício do governo, que é o benefício por dedução do Imposto de Renda.

Então estamos falando de um modelo em que os mais ricos não receberiam mais do que já recebem, mas grupos intermediários e pobres receberiam mais do que hoje.

E não vejo como uma substituição do Bolsa Família, é mais como uma ampliação. Não deixaríamos de proteger famílias sem crianças, mas priorizaríamos famílias com crianças.

Em muitos países é assim. Há uma assistência social em que as famílias com crianças recebem uma prioridade maior, sem que isso implique que não vá existir aposentadoria ou benefício para as famílias pobres sem crianças.

BBC News Brasil – Um estudo do Made-USP estima que o Novo Bolsa Família deve ter retirado quase 11 milhões da pobreza em 2023, uma redução sem precedentes. Mas esse mesmo estudo mostra que 71% dos ainda pobres são pretos e pardos. Me chamou a atenção que, no seu livro, apesar de mencionar bastante as desigualdades de gênero e raça, você se concentra em reformas para a totalidade da população e pouco em políticas específicas para os grupos vulnerabilizados. Isso é suficiente para reduzir a desigualdade racial, que talvez seja uma das mais graves do país?

Nery – Eu acredito que muitas políticas que são mais universais acabam atingindo mais a população parda e preta. Um exemplo é creche, outro é transferência de renda, como o Bolsa Família.

Então acredito que às vezes não é tão necessária uma política específica, porque os pretos e pardos correspondem à maior parte de um grupo vulnerável atingido por uma política mais universal, sem a gente ter a criação de algum estigma em relação a esse grupo.

Então a própria ideia do benefício da renda universal infantil é muito discutida nesses moldes – um benefício que é recebido por todos, embora tenha benefício maior sobre os mais pobres.

Será que isso não é melhor do ponto de vista da formação de uma coalizão política na sociedade capaz de garantir a sustentação e a ampliação desse benefício? E também no sentido de combater estigmas e preconceitos?

Então esse é um pouco da discussão que se coloca quando a gente propõe uma política pública que não é nominalmente voltada apenas para um grupo de maior desvantagem, sejam mulheres ou negros.

BBC News Brasil – Mas o fato de que, mesmo com todas as políticas que temos hoje, os pretos e pardos continuarem sobrerrepresentados na população mais pobre não sugere que talvez seja preciso mais? Que sejam necessárias políticas mais focadas?

Nery – A própria ampliação do Bolsa da Família atingiu muito mulheres, mães solo, pretos, pardos, jovens e crianças, sem a gente ter falado assim: “Olha, isso aqui é para a mulher negra”. O Auxílio Emergencial, a mesma coisa.

De certa forma, isso foge um pouco da expertise [competência de especialista] dos economistas e vai mais para uma expertise de comunicação ou de política.

O auxílio emergencial, como o próprio Made-USP mostra, beneficiou majoritariamente mulheres negras, sem que isso tenha sido tanto levantado no debate e talvez, sinceramente, sem que o próprio governo anterior tenha percebido.

Então, acredito que é uma questão que, de certa forma, foge do meu conhecimento, se é melhor falarmos claramente sobre os grupos que mais se beneficiarão ou se, em busca de um consenso maior, a gente não toca necessariamente nessa questão.

Sinceramente, eu não sei.

BBC News Brasil – Muitas das reformas que você defende para reduzir a desigualdade são parte da agenda liberal clássica: reforma da Previdência, da administração pública, uma legislação trabalhista mais flexível. São agendas que são percebidas por parte da população como de perda de direitos. Muitas vezes, os liberais defendiam essas reformas com argumentos fiscalistas [de equilíbrio das contas públicas], que têm pouco apelo para a população em geral. Sua opção por apresentá-las como parte de uma agenda de combate à desigualdade é uma forma de tentar tornar essas reformas impopulares mais sexys?

Nery – Você tocou num ponto essencial. Um desejo que eu tenho é que, discutindo desigualdade, a gente consiga quebrar algumas polarizações e colocar a bola no chão.

Então, em alguns momentos do livro, eu imagino que eu esteja tentando convencer um leitor que é mais à direita. Por exemplo, quando eu falo de tributação da renda ou da importância da desigualdade para o crescimento do PIB.

Em outros momentos, eu sinto que estou tentando convencer mais um leitor à esquerda. Por exemplo, quando tento lembrar que, em muitos países, foram governos de esquerda que falaram de flexibilização ou de redução da tributação no mercado de trabalho.

Então uma coisa que eu queria é que esse não fosse um livro nichado. Nem só da esquerda, porque trata da desigualdade, nem da direita, porque fala de reformas liberais.

Eu queria que a gente olhasse mais para a ciência, para a experiência internacional, e fugisse um pouco dessa polarização, que é um pouco o meu background por ter trabalhado no Congresso [como assessor legislativo do Senado Federal].

Lá, de manhã você trabalha para um senador de esquerda, de tarde, para um senador de direita. E você vê que todo mundo tem vontade de acertar, de ter um país melhor e mais justo. Então eu acho que o livro tem essa característica.

BBC News Brasil – Então você acredita que a desigualdade pode ser um tema comum entre os dois lados do espectro político, pode ajudar a criar consensos, é isso?

Nery – Acho que sim. No Brasil, temos uma tradição de ter um apoio multipartidário para esses temas. Veja, por exemplo, na ampliação do Bolsa Família ou no Auxílio Emergencial, que foram temas consensuais no Congresso, mesmo com toda a polarização dos últimos anos.

Historicamente, há coisas que são até intrigantes. Por exemplo, o Fundo de Erradicação da Pobreza foi uma criação do ex-senador Antônio Carlos Magalhães, um bastião do PFL [hoje Democratas, um partido tradicionalmente de direita].

E se a gente olha a nossa Constituição, ela tem um compromisso muito claro com a erradicação da pobreza e redução das desigualdades.

Então acredito que existe espaço para explorar algum entendimento comum de que é importante reduzir a desigualdade.

Pode ser que cada reforma tenha divergências entre esquerda e direita, acho que isso é natural. Mas não podemos desistir de buscar a convergência, e eu penso que temos feito isso bem no Brasil nos últimos anos.

Basta lembrar que tivemos uma reforma do Imposto de Renda pautada pelo ministro Paulo Guedes. Temos o governo do presidente Lula mantendo reformas importantes feitas pelos governos Temer e Bolsonaro, como a da Previdência e a trabalhista.

Tivemos uma ampliação do Bolsa Família, primeiro como Auxílio Emergencial, depois como Auxílio Brasil, num governo cujo presidente repudiava o programa.

Há poucos anos, quando comecei a escrever o livro, lá em 2020, eu não imaginaria que a gente teria pautado a reforma do Imposto de Renda como está sendo feito.

Que a gente passaria uma reforma tributária, que o orçamento do Bolsa Família seria tão ampliado, tudo com maiorias largas no Congresso, e sem demonstrações muito grandes de resistência na sociedade.

Então a desigualdade no Brasil cai lentamente, mas existe espaço para otimismo e para uma convergência.

BBC News Brasil – Nos últimos anos, temos visto cada vez mais economistas liberais tomando parte no debate nacional sobre desigualdade. Temos você, Armínio Fraga, Ricardo Paes de Barros e tantos outros tratando desse tema. Na sua avaliação, por que os liberais brasileiros têm se dedicado cada vez mais a essa pauta que talvez antes fosse percebida mais como uma agenda da esquerda?

Nery – É uma boa pergunta. Eu não sei, talvez por influência do debate externo que veio com o [economista francês Thomas] Piketty. Ou do debate americano.

Mas essa realmente é uma boa provocação, que eu não saberia responder.

Não sei também o quanto disso vem de termos superado outros temas. Quer dizer, sempre temos a preocupação fiscal, mas ela já não é tão grande quanto era alguns anos atrás, em que falávamos tanto de grau de investimento e outras coisas.

Mas você tem razão que existe um carinho maior pelo tema do que existia antes, talvez pelas próprias evidências que têm saído e que coloco também no livro, de que desigualdade importa para a democracia, importa para o crescimento econômico e por isso não pode ser considerada como algo alheio ao debate sobre consolidação da democracia ou sobre medidas para o crescimento econômico.

BBC News Brasil – Em que lugar você se coloca no espectro político brasileiro, sendo um economista liberal, mas que trabalha atualmente para um governo do PT?

Nery – Eu me acostumei tanto a trabalhar para esquerda e para a direita no Senado, e a ser xingado pelos dois lados quando eu era colunista no Estadão, que não me preocupo tanto com isso.

De fato, eu participo de um governo que é de frente ampla, que vai da ministra Sônia Guajajara [do Ministério dos Povos Indígenas e do Psol] ao ministro André Fufuca [do Ministério do Esporte e filiado ao Progressistas], mas que é liderado pelo presidente Lula.

E participo com entusiasmo e com vontade de defender as medidas que estão sendo tomadas.

Mas, sinceramente, eu não saberia me colocar. Quando me perguntam isso, tem uma rima que eu gosto de dizer que é que, dependendo do que eu escrevia no jornal, me chamavam de “liberal planilheiro” ou de “comunista maconheiro”.

Então o que me motiva mais é olhar a ciência, a realidade, a experiência internacional e não pensar tanto em ideologia. Até porque, às vezes, isso divide mais do que conquista.

BBC News Brasil – Estando dentro do governo, como você vê a queda de popularidade do presidente Lula, apesar do bom momento que vive a economia? Muitos analistas creditam isso à inflação de alimentos ainda resistente e que afeta particularmente os mais pobres. Você concorda com essa avaliação?

Nery – Eu não conheço essa avaliação. Mas outro dia estava vendo uma discussão sobre os Estados Unidos, que poderia ser importada para cá.

Porque parece que, tanto para os EUA, quanto para o Brasil, isso está acontecendo. É o que o pessoal chama de “good numbers and bad vibes” [bons números e más vibrações].

Você tem ali o presidente [Joe] Biden com um desemprego na mínima histórica para mulheres e negros, além da economia crescendo, e a inflação cadente. Mas tem um presidente em grave ameaça de perder sua reeleição.

E eu penso que esse é um tema que vai continuar sendo discutido também no Brasil nos próximos anos. Há uma divergência nos padrões históricos entre medidas de prosperidade econômica e medidas de popularidade.

O governo [Lula] tem desemprego baixo, inflação baixa. Como você mencionou, deve poder reportar em breve taxas historicamente baixas de pobreza e de extrema pobreza.

Mas uma certa polarização parece impedir que esses resultados tenham uma consequência em termos de popularidade como tinham no passado.

É um tema novo, que diz respeito também aos sociólogos e aos cientistas políticos, e que vai continuar nos interessando nos próximos anos.

Somos de uma geração que cresceu imaginando que a economia decidia a política e hoje parece que não é bem assim.

BBC News Brasil – Por fim, você termina seu livro – e desculpe desde já o spoiler para quem ainda não leu – num tom otimista, dizendo que “há caminhos para o nosso país”. O que te leva a ser otimista?

Nery – Se olharmos com carinho para o que o Brasil conquistou, temos razão para ser otimistas. Nos últimos anos, temos falado muito sobre democracia.

Há setores da sociedade com um certo saudosismo do regime militar e que acreditam na ideia de que a democracia não traz crescimento econômico.

Mas reduzimos o analfabetismo em 80% sob a democracia. Dobramos os anos de estudo. A pobreza foi reduzida à metade e a extrema pobreza foi reduzida a um terço do que era.

A mortalidade infantil despencou, a expectativa de vida aumentou em dez anos.

Pensando do ponto de vista de um economista, se há dez anos alguém falasse que a gente teria feito reforma tributária, reforma da Previdência, modificações no mercado de trabalho, a super ampliação do Bolsa Família, eu acho que haveria ceticismo.

Então, mesmo quando eu vejo o que mudou desde quando eu comecei a escrever o livro – a mudança do Bolsa Família, os avanços na tributação da renda –, em pouco espaço de tempo, vejo que coisas mudaram.

Então eu vejo que, de uma forma que talvez não apreciemos sempre, e que talvez seja mais lenta do gostaríamos, a democracia tem trazido resultados positivos no combate à desigualdade.

O Brasil é um país melhor do que era antes. E eu acredito que essa é uma mensagem importante, não só para quem está no serviço público, trabalhando com política pública, mas para qualquer um quer se engajar, seja no terceiro setor, seja como eleitor, etc.

As coisas podem melhorar, elas têm melhorado. E quando olhamos com parcimônia os dados, com tranquilidade, vemos que, por trás dessa realidade que às vezes parece tão caótica, têm coisas muito boas acontecendo.

Governo Lula quer usar gasoduto Brasil-Bolívia para trazer gás da Argentina

O governo Luiz Inácio Lula da Silva quer importar gás natural da reserva de Vaca Muerta, na Argentina, para garantir o abastecimento das indústrias brasileiras e estuda formas técnicas de fazer essa operação. Existe uma forte preocupação em termos de oferta, porque a Bolívia, principal fornecedor, está com uma produção decrescente. Uma das saídas é usar a parte ociosa do Gasoduto Brasil-Bolívia (Gasbol) para trazer o gás argentino.

Hoje, os bolivianos só enviam ao Brasil 15 milhões de metros cúbicos (m3) por dia, quando deveriam entregar 30 milhões m³/dia. E o Brasil tem uma carência no fornecimento. O gás doméstico é caro e insuficiente, na avaliação do governo.

Porém, as duas possibilidades em estudo para trazer ao Brasil o gás argentino dependem da conclusão da segunda parte do Gasoduto Néstor Kirchner, que liga a região de Vaca Muerta, a partir da província de Buenos Aires, até Uruguaiana (RS).

No ano passado, quando o país era presidido por Alberto Fernández, a previsão era que as obras fossem concluídas até o fim de 2024 ou início de 2025. Mas o novo presidente argentino, Javier Milei, ainda não sinalizou se há interesse na obra ou em manter o prazo estimado.

Salto na produção

Dentro do governo Milei, há um grande defensor dessa integração com o Brasil: o ex-embaixador da Argentina em Brasília Daniel Scioli, atualmente secretário de Turismo, Ambiente e Esportes do Ministério do Interior. O Brasil conta com o ex-embaixador para garantir a continuidade da obra. Procurado pelo GLOBO, Scioli não se manifestou sobre a ampliação do gasoduto.

Concluída a segunda etapa do duto argentino, o gás poderia chegar ao Brasil por dois caminhos. O primeiro seria usando uma parte ociosa do Gasbol, inclusive pagando um pedágio aos bolivianos pela passagem. O gás viria ao Brasil por meio de uma conexão entre os gasodutos Norte e Néstor Kirchner.

Disputa pelo comando da Petrobras:

‘Machucado’ e ‘no limite’: o desabafo do presidente da Petrobras a amigos

Prates faz piada: posta que sai da Petrobras… hoje às 20h e volta amanhã às 7h

Disputa em torno do comando da Petrobras cria apreensão no conselho, que teme paralisia na estatal

Haddad, que sempre foi escudo de Prates na Petrobras, não será mais seu fiador

Ministros de Lula selam acordo pelo pagamento de dividendos extras da Petrobras

Maior empresa privada de energia da Argentina e maior produtora privada do gás de Vaca Muerta, a Pan American Energy (PAE) vê como importante os investimentos na ampliação da malha de gasodutos do país vizinho.

Segundo Alejandro Catalano, diretor-geral da PAE no Brasil, o gás de Vaca Muerta, segunda maior reserva de gás não convencional do mundo, tem ainda um grande potencial de crescimento.

Gás chegaria ao Brasil em 2025

Ele lembra que a produção da companhia aumentou de 2,5 milhões m3 por dia em 2015 para 13 milhões m3 cúbicos por dia em 2023. Ao citar a importância da infraestrutura, lembrou que parte da produção já é exportada para o Chile, por meio de quatro diferentes redes de gasodutos.

— A Argentina tem gás competitivo. Tem que ser feita infraestrutura para compartilhar esse gás com a região. Acreditamos que isso vai acontecer. É uma fonte competitiva para a região e a integração dos países. O gás é a ponte para o futuro — afirma Catalano.

Segundo ele, a Argentina tem investido na ampliação da infraestrutura. Ele cita a inauguração da Etapa I do Gasoduto Néstor Kirchner, conectando a região de Vaca Muerta a Saliqueló, na província de Buenos Aires.

Cita ainda a perspectiva de início das obras da Etapa II do gasoduto, de Saliqueló até San Jerónimo, de onde teria de ser feita uma ampliação para levar o traçado até o gasoduto que faz a conexão com a cidade gaúcha de Uruguaiana.

Catalano lembra ainda outro investimento importante que será feito este ano: a inversão do Gasoduto Norte na Argentina. Isso permitirá direcionar o gás para a Bolívia, cuja molécula, então, poderá ser integrada ao Gasbol:

— Potencialmente esse gás poderia chegar ao Brasil em 2025. Apesar da complexidade de ter mais países envolvidos, há necessidade de um gás competitivo. Por isso, acreditamos que é possível uma negociação.

A segunda possibilidade seria via Rio Grande do Sul. O gás entraria no estado, mas para isso seria necessário construir um gasoduto de Uruguaiana até Porto Alegre. A obra foi considerada prioritária no Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) pelo governador Eduardo Leite.

Inversão do fluxo

Segundo empresas ouvidas pelo GLOBO, o desafio é o investimento necessário para isso. A obra, orçada entre US$ 1 bilhão e US$ 1,2 bilhão, nunca saiu do papel.

A TSB, que opera o trecho de 25 quilômetros que liga a malha argentina até Uruguaiana e o trecho em Porto Alegre, tem como acionistas Petrobras, Ipiranga, Repsol e Total. Cada uma tem 25% da empresa. Procurada, a Petrobras disse apenas que não é a controladora.

Se a ligação entre Uruguaiana e Porto Alegre sair do papel, outra questão importante é que será preciso ajustar o Gasbol. Hoje, o gasoduto é uma “via de mão única”, seguindo do Mato Grosso do Sul em direção ao Rio Grande do Sul. Esse fluxo também teria que subir, passando a levar o gás da Região Sul para cima, para atender Minas Gerais, por exemplo, tornando-se uma espécie de pista dupla.

Um interlocutor do governo comentou que há empresas brasileiras interessadas em fornecer equipamentos, como canos, para a construção do gasoduto na Argentina. Mas, se quiserem realizar a obra, não poderão contar com a ajuda do BNDES, que atualmente só financia produtos e mediante apresentação de garantias. Um interlocutor do banco de fomento enfatizou que a liberação de recursos para financiamento de serviços está suspensa.

Elevada reinjeção

Segundo dados do Ministério de Minas e Energia, o Brasil produziu 130 milhões m3 de gás natural por dia em 2023. Entretanto, metade desse volume, ou o equivalente a 70 milhões m³, foi reinjetado, ou seja, voltou para o poço.

Outros 20 milhões não são comercializados no mercado brasileiro devido à queima, a perdas e ao consumo nas próprias plataformas. Com isso, sobram 40 milhões m³ para uma demanda interna estimada em 60 milhões m³ ao dia.

— Vaca Muerta é uma boa saída. Mais de 90% do mercado são dominados pela Petrobras. Como há pouquíssima competição, a empresa forma o preço. Um novo competidor seria muito interessante para nós — afirma Adriano Lorenzon, diretor responsável por gás natural da Abrace, associação que representa os grandes consumidores de gás e energia do Brasil.

Lorenzon explica que há algumas explicações para que os produtores reinjetem tamanha quantidade de gás. Uma delas é que o mecanismo aumenta a pressão e amplia a produção de petróleo. Outra é que o nível de contaminantes, com ênfase para o CO2, é muito alto.

Para construir a segunda parte do gasoduto, o governo anterior da Argentina anunciou que faria uma licitação. Um integrante do governo brasileiro acredita que Milei poderá abraçar a ideia, dadas as dificuldades econômicas perenes do país vizinho.

Governo Lula quer usar gasoduto Brasil-Bolívia para trazer gás da Argentina

O governo Luiz Inácio Lula da Silva quer importar gás natural da reserva de Vaca Muerta, na Argentina, para garantir o abastecimento das indústrias brasileiras e estuda formas técnicas de fazer essa operação. Existe uma forte preocupação em termos de oferta, porque a Bolívia, principal fornecedor, está com uma produção decrescente. Uma das saídas é usar a parte ociosa do Gasoduto Brasil-Bolívia (Gasbol) para trazer o gás argentino.

Hoje, os bolivianos só enviam ao Brasil 15 milhões de metros cúbicos (m3) por dia, quando deveriam entregar 30 milhões m³/dia. E o Brasil tem uma carência no fornecimento. O gás doméstico é caro e insuficiente, na avaliação do governo.

Porém, as duas possibilidades em estudo para trazer ao Brasil o gás argentino dependem da conclusão da segunda parte do Gasoduto Néstor Kirchner, que liga a região de Vaca Muerta, a partir da província de Buenos Aires, até Uruguaiana (RS).

No ano passado, quando o país era presidido por Alberto Fernández, a previsão era que as obras fossem concluídas até o fim de 2024 ou início de 2025. Mas o novo presidente argentino, Javier Milei, ainda não sinalizou se há interesse na obra ou em manter o prazo estimado.

Salto na produção

Dentro do governo Milei, há um grande defensor dessa integração com o Brasil: o ex-embaixador da Argentina em Brasília Daniel Scioli, atualmente secretário de Turismo, Ambiente e Esportes do Ministério do Interior. O Brasil conta com o ex-embaixador para garantir a continuidade da obra. Procurado pelo GLOBO, Scioli não se manifestou sobre a ampliação do gasoduto.

Concluída a segunda etapa do duto argentino, o gás poderia chegar ao Brasil por dois caminhos. O primeiro seria usando uma parte ociosa do Gasbol, inclusive pagando um pedágio aos bolivianos pela passagem. O gás viria ao Brasil por meio de uma conexão entre os gasodutos Norte e Néstor Kirchner.

Disputa pelo comando da Petrobras:

‘Machucado’ e ‘no limite’: o desabafo do presidente da Petrobras a amigos

Prates faz piada: posta que sai da Petrobras… hoje às 20h e volta amanhã às 7h

Disputa em torno do comando da Petrobras cria apreensão no conselho, que teme paralisia na estatal

Haddad, que sempre foi escudo de Prates na Petrobras, não será mais seu fiador

Ministros de Lula selam acordo pelo pagamento de dividendos extras da Petrobras

Maior empresa privada de energia da Argentina e maior produtora privada do gás de Vaca Muerta, a Pan American Energy (PAE) vê como importante os investimentos na ampliação da malha de gasodutos do país vizinho.

Segundo Alejandro Catalano, diretor-geral da PAE no Brasil, o gás de Vaca Muerta, segunda maior reserva de gás não convencional do mundo, tem ainda um grande potencial de crescimento.

Gás chegaria ao Brasil em 2025

Ele lembra que a produção da companhia aumentou de 2,5 milhões m3 por dia em 2015 para 13 milhões m3 cúbicos por dia em 2023. Ao citar a importância da infraestrutura, lembrou que parte da produção já é exportada para o Chile, por meio de quatro diferentes redes de gasodutos.

— A Argentina tem gás competitivo. Tem que ser feita infraestrutura para compartilhar esse gás com a região. Acreditamos que isso vai acontecer. É uma fonte competitiva para a região e a integração dos países. O gás é a ponte para o futuro — afirma Catalano.

Segundo ele, a Argentina tem investido na ampliação da infraestrutura. Ele cita a inauguração da Etapa I do Gasoduto Néstor Kirchner, conectando a região de Vaca Muerta a Saliqueló, na província de Buenos Aires.

Cita ainda a perspectiva de início das obras da Etapa II do gasoduto, de Saliqueló até San Jerónimo, de onde teria de ser feita uma ampliação para levar o traçado até o gasoduto que faz a conexão com a cidade gaúcha de Uruguaiana.

Catalano lembra ainda outro investimento importante que será feito este ano: a inversão do Gasoduto Norte na Argentina. Isso permitirá direcionar o gás para a Bolívia, cuja molécula, então, poderá ser integrada ao Gasbol:

— Potencialmente esse gás poderia chegar ao Brasil em 2025. Apesar da complexidade de ter mais países envolvidos, há necessidade de um gás competitivo. Por isso, acreditamos que é possível uma negociação.

A segunda possibilidade seria via Rio Grande do Sul. O gás entraria no estado, mas para isso seria necessário construir um gasoduto de Uruguaiana até Porto Alegre. A obra foi considerada prioritária no Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) pelo governador Eduardo Leite.

Inversão do fluxo

Segundo empresas ouvidas pelo GLOBO, o desafio é o investimento necessário para isso. A obra, orçada entre US$ 1 bilhão e US$ 1,2 bilhão, nunca saiu do papel.

A TSB, que opera o trecho de 25 quilômetros que liga a malha argentina até Uruguaiana e o trecho em Porto Alegre, tem como acionistas Petrobras, Ipiranga, Repsol e Total. Cada uma tem 25% da empresa. Procurada, a Petrobras disse apenas que não é a controladora.

Se a ligação entre Uruguaiana e Porto Alegre sair do papel, outra questão importante é que será preciso ajustar o Gasbol. Hoje, o gasoduto é uma “via de mão única”, seguindo do Mato Grosso do Sul em direção ao Rio Grande do Sul. Esse fluxo também teria que subir, passando a levar o gás da Região Sul para cima, para atender Minas Gerais, por exemplo, tornando-se uma espécie de pista dupla.

Um interlocutor do governo comentou que há empresas brasileiras interessadas em fornecer equipamentos, como canos, para a construção do gasoduto na Argentina. Mas, se quiserem realizar a obra, não poderão contar com a ajuda do BNDES, que atualmente só financia produtos e mediante apresentação de garantias. Um interlocutor do banco de fomento enfatizou que a liberação de recursos para financiamento de serviços está suspensa.

Elevada reinjeção

Segundo dados do Ministério de Minas e Energia, o Brasil produziu 130 milhões m3 de gás natural por dia em 2023. Entretanto, metade desse volume, ou o equivalente a 70 milhões m³, foi reinjetado, ou seja, voltou para o poço.

Outros 20 milhões não são comercializados no mercado brasileiro devido à queima, a perdas e ao consumo nas próprias plataformas. Com isso, sobram 40 milhões m³ para uma demanda interna estimada em 60 milhões m³ ao dia.

— Vaca Muerta é uma boa saída. Mais de 90% do mercado são dominados pela Petrobras. Como há pouquíssima competição, a empresa forma o preço. Um novo competidor seria muito interessante para nós — afirma Adriano Lorenzon, diretor responsável por gás natural da Abrace, associação que representa os grandes consumidores de gás e energia do Brasil.

Lorenzon explica que há algumas explicações para que os produtores reinjetem tamanha quantidade de gás. Uma delas é que o mecanismo aumenta a pressão e amplia a produção de petróleo. Outra é que o nível de contaminantes, com ênfase para o CO2, é muito alto.

Para construir a segunda parte do gasoduto, o governo anterior da Argentina anunciou que faria uma licitação. Um integrante do governo brasileiro acredita que Milei poderá abraçar a ideia, dadas as dificuldades econômicas perenes do país vizinho.

Lula: “tenho obsessão pela educação profissional”

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O governo federal lançou, nesta quinta-feira (11), a pedra fundamental do Campus Sol Nascente do Instituto Federal de Brasília (IFB). A cerimônia contou com a participarão do presidente Lula, do ministro da Educação, Camilo Santana, da vice-governadora do Distrito Federal, Celina Leão, além de servidores da educação, estudantes, movimentos populares e comunidade.

Em seu discurso, Lula destacou a importância de uma escola técnica pelas oportunidades que ela oferece. “Tenho ainda uma obsessão pela educação profissional, porque é a formação profissional que faz as pessoas viverem melhor. Quando a gente tem uma profissão, a gente tem possiblidade de ter um bom emprego, de ganhar um salário melhor, de poder constituir família, de ter uma família vivendo em paz e viver dignamente como cidadãos civilizados, vivendo aquilo que todo mundo tem direito”, reforçou.

A unidade integra o plano de expansão dos institutos federais pelo Novo Programa de Aceleração do Crescimento (Novo PAC). O investimento previsto é de R$ 2,5 bilhões para construção de 100 novos campi pelo Brasil, com a meta de gerar 140 mil novas vagas de educação profissional.

Os novos campi de institutos federais atenderão regiões que ainda não possuem unidades ou que registram número baixo de matrículas em cursos técnicos de nível médio em relação à população da região.

No Distrito Federal, serão duas novas unidades: Sol Nascente e Sobradinho. Cada nova escola tem custo estimado de R$ 25 milhões, sendo R$ 15 milhões para infraestrutura e R$ 10 milhões para aquisição de equipamentos e mobiliário. Quando estiverem concluídas, a expectativa é que as unidades gerem, cada uma, 1.400 vagas, majoritariamente de cursos técnicos integrados ao ensino médio.

Além da expansão com novas unidades, o Novo PAC também contempla R$ 1,4 bilhões para a consolidação de Institutos Federais já existentes, com a construção de refeitórios estudantis, ginásios, bibliotecas, salas de aula e aquisição de equipamentos.

Santana afirmou que o lançamento é conquista para a região. “Aqui, nós vamos ter um instituto federal que vai dar oportunidade para 1.400 jovens do Sol Nascente, que terão a oportunidade de fazer o ensino técnico integrado com o ensino médio, de cursar licenciatura. É enxergar o potencial que cada um aqui do Sol Nascente tem”, declarou.

Os estudantes do IFB foram representados por Thaís Moreira, formada no curso tecnólogo de produção em áudio e vídeo. Segundo ela, a criação dos institutos federais dentro das periferias é muito importante para proporcionar aos moradores dessa região a democratização e a qualidade da educação, de modo que a juventude possa ter a oportunidade de acessar as universidades públicas, assim como o mercado de trabalho.

“Hoje, celebramos uma grande conquista para os moradores do Sol Nascente. Isso demonstra um grande avanço pela educação. E desejo que assim se mantenha não só apenas as estruturas [dos institutos federais], mas a valorização do plano de carreira dos nossos docentes, pois eles são a alma e o coração dessa instituição. Eu não teria chegado até o fim sem a ajuda dos auxílios estudantis e de toda a rede de apoio que me cerca. Eu gostaria que todos os estudantes futuros também tivessem essa oportunidade”, afirmou.

Sol Nascente foi transformada em região administrativa em agosto de 2019, após ter sido desmembrada de Ceilândia. É considerada, segundo dados do Censo 2022 do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), uma das maiores comunidades urbanas do Brasil.

De acordo com a reitora do IFB, Veruska Machado, a construção do Campus Sol Nascente é fruto de um trabalho coletivo, em prol de uma educação de qualidade e de oportunidade de transformar vidas. “Todos os dias, como trabalhadora da educação, acompanho transformação de vidas. Essas vidas transformam os territórios em que elas estão inseridas e é isso que a gente pretende trazer, nesse momento, para o Sol Nascente. As pessoas transformadas transformam as suas vidas e das suas famílias”, disse.

O termo de cessão de uso do terreno em que vai ser construído o novo campus do IFB foi assinado pelo presidente da Terracap, Izídio Santos, e pela reitora Veruska Machado. A vice-governadora do DF, Celina Leão, afirmou que a iniciativa reafirma o compromisso do governo do Distrito Federal com a educação. “Nós acreditamos na educação, temos 18 unidades de educação profissional [do GDF] e agora serão 12 do governo federal”, pontuou.

João Campos filia secretários a partidos aliados e cria alternativas ao PT por vice no Recife

O prefeito do Recife, João Campos (PSB), articulou a filiação de quatro secretários municipais a partidos aliados como alternativas para a vaga de vice na chapa dele que buscará a reeleição nas eleições de outubro.

As filiações, durante a janela partidária encerrada no sábado (6), acontecem no momento em que o prefeito é pressionado pelo PT, que quer preencher a vaga na expectativa de assumir a prefeitura em caso de renúncia do prefeito para ser candidato a governador em 2026 ou de ter apoio dele para um eventual candidato petista no enfrentamento contra a governadora Raquel Lyra (PSDB).

O PSB prefere que um aliado de confiança de João Campos e com perfil para virar prefeito seja o vice do prefeito. Na visão do partido, os quatro secretários que se aliaram a partidos da base de João Campos se encaixam nesses critérios.

Entraram em partidos, na reta final do prazo de filiação, os secretários municipais de Finanças, Maíra Fischer (União Brasil); Infraestrutura, Marília Dantas (MDB); de Planejamento, Felipe Matos (Republicanos); e o chefe de gabinete, Victor Marques (PC do B), que também tem status de secretário.

Victor Marques tem perfil mais político, embora não tenha disputado mandatos. Ele é considerado o braço direito de João Campos. Ambos são engenheiros. Também é amigo do prefeito há anos e de extrema confiança dele. O PC do B, partido ao qual Victor agora é filiado, foi vice de Geraldo Julio no Recife de 2013 a 2020 e de Paulo Câmara em Pernambuco de 2015 a 2022.

Marília Dantas comanda uma pasta com Orçamento de R$ 1 bilhão por ano e as obras com mais impacto na cidade, como encostas em morros, pontes e calçamento de ruas. Ela foi presidente da Emlurb, estatal que cuida da limpeza urbana na gestão do ex-prefeito Geraldo Julio (PSB).

Maíra Fischer é responsável pelas finanças da prefeitura. Ela foi chamada por João Campos quando era secretária-executiva de Desenvolvimento Econômico de Pernambuco no governo Paulo Câmara, à época do PSB.

Felipe Matos tem perfil mais discreto, mas é tido na prefeitura como o responsável pelas inovações digitais e é responsável pelas parcerias público-privadas da gestão. Ele é oriundo da iniciativa privada e está no governo João Campos desde o início em 2021.

João Campos externou publicamente que pretende definir apenas o nome para a vice na chapa apenas em julho, após o início das convenções partidárias, que se estendem até o começo de agosto. Entretanto, a definição pode ser antecipada para o início de junho, quando secretários que vão disputar eleições para prefeito ou vice precisam deixar seus cargos.

Com as filiações, João Campos buscou também prestigiar os partidos aliados. O MDB anunciou apoio à sua reeleição recentemente, enquanto o Republicanos é chefiado pelo ministro de Portos e Aeroportos, Silvio Costa Filho, que é definido nos bastidores como “uma coisa só” junto com João Campos, em razão da unidade dos dois na atuação política. O PC do B é aliado histórico, ao ponto de já ter divergido do PT, principal aliado no plano nacional, para ficar ao lado do PSB em Pernambuco.

Ainda no páreo, o PT —até agora o partido que mais se mostra interessado em ocupar a vice— tem dois nomes como pré-candidatos à vaga: o assessor do Ministério das Relações Institucionais, Mozart Sales, e o deputado federal Carlos Veras (PE).

Mozart tem apoio da maioria no diretório municipal do partido no Recife, do ministro Alexandre Padilha (Relações Institucionais) e da senadora Teresa Leitão (PT-PE), enquanto Veras é aliado do senador Humberto Costa (PT-PE).

Os petistas de Pernambuco dizem que o presidente Lula (PT) poderá ser decisivo na tentativa de convencer João Campos a colocar um integrante do PT como vice.

O entorno do prefeito diz que, se Lula insistir, o chefe do Executivo municipal jamais diria não ao presidente, mas há dúvidas tanto no PT quanto no PSB se Lula estaria disposto a se mostrar irredutível no assunto.

Um fator que atrapalha o PT, reconhecido no próprio partido, é a divisão. Por isso, os movimentos para buscar uma unificação foram ampliados nas últimas semanas, ainda sem êxito.

No Recife, o PT abriu inscrições para a candidatura a vice-prefeito, mesmo sem ter a certeza de que ocupará a vaga. O episódio foi entendido como uma pressão sobre o prefeito, que não deu sinais de que acatará o calendário petista, que queria definir a situação até o fim de abril.

Desde o início de março, João Campos articulou os apoios de MDB, Avante e Solidariedade à sua reeleição. No caso do Solidariedade, ele fez as pazes com a ex-deputada Marília Arraes após os primos de segundo grau terem trocado farpas durante a disputa do segundo turno nas eleições do Recife em 2020, quando ela estava no PT. Marília quer ser candidata ao Senado numa eventual chapa de João Campos como candidato a governador em 2026.

A próxima batalha envolve a União Brasil, mas o prefeito está confiante na aliança, mesmo com o deputado federal Mendonça Filho, desafeto do PT, na presidência da legenda no Recife. O fato da secretária Maíra Fischer ter sido aceita como filiada do partido já é um indicativo de que as tratativas estão avançadas.

O prefeito conta com o ex-prefeito de Petrolina Miguel Coelho como voz na União Brasil a seu favor e diz acreditar que haverá um acordo no Recife, mesmo se Mendonça Filho tiver posição pessoal diferente. Coelho que quer disputar o Senado em 2026 numa eventual chapa de João.

Na oposição, os principais candidatos são o ex-ministro do Turismo Gilson Machado Neto (PL) e o secretário de Turismo do Governo de Pernambuco, Daniel Coelho, recém-filiado ao PSD, que tem apoio de Podemos, PP e da federação PSDB/Cidadania, da governadora Raquel Lyra.

O deputado federal Túlio Gadêlha (Rede) e a deputada estadual Dani Portela (PSOL) disputam a candidatura na federação entre os dois partidos. Dani tem a maioria no diretório em Pernambuco, mas Túlio articula para obter aval da direção nacional da federação para ser candidato. Caso se viabilize, deverá ter apoio do PDT.

Menos linhas de ônibus, fim da segunda pista seletiva e limitação de caminhões: especialistas apontam soluções para engarrafamentos na Brasil

O primeiro dia útil de funcionamento ampliado do BRT Transbrasil — com veículos circulando pelo corredor exclusivo de 4h à meia-noite, com intervalos de dez minutos — foi marcado, a exemplo do que já havia acontecido no período de testes há uma semana, por sensações bastantes distintas: enquanto uns comemoravam o trânsito livre e a viagem rápida a bordo dos veículos articulados, outros reclamavam do engarrafamento nas pistas reservadas ao tráfego misto. Enquanto a prefeitura afirma que precisa de tempo para fazer os ajustes, especialistas dão alguns caminhos possíveis para destravar o tráfego para todos como reordenamento de linhas de ônibus comuns, eliminação da segunda pista seletiva e limitação do tráfego de caminhões.

‘Engarrafamento agora só pela janela’, diz passageiro do BRT Transbrasil que chegou 1h40 mais cedo ao trabalho Guerra urbana: Estudante da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro é morto em tiroteio no Centro de Seropédica; duas crianças baleadas e mãe ferida

— A gente tem estudado e pensado num cardápio de soluções, mas é cedo para ter qualquer conclusão, precisamos observar como o tráfego vai comportar ao longo do tempo, não tem outro jeito. Não podemos tomar uma medida agora e outra medida na semana que vem. A gente entende a angústia da população e vamos trabalhar para fazer os ajustes necessários. De imediato temos que comemorar o sucesso que tem sido a operação do BRT Transbrasil — analisa Maína Celidonio, secretária municipal de Transportes.

BRT Transbrasil

1 de 6 BRT Transbrasil tem ponto final no Terminal Gentileza, na região central do Rio, onde se conecta a outros modais — Foto: Gabriel de Paiva/Agência O Globo/Arquivo 2 de 6 A passagem do VLT custa R$ 4,30 e a sua integração com o BRT e os ônibus está garantida no Terminal Gentileza. — Foto: Fabiano Rocha / Agência O Globo

6 fotos

3 de 6 Avenida Brasil na altura da Fiocruz. Operação do novo corretor BRT Transbrasil dá início à calha segregada — Foto: Márcia Foletto/Agência O Globo 4 de 6 Estação do BRT Transbrasil em frente à Fiocruz, na Avenida Brasil — Foto: Fabiano Rocha/Agência O Globo 5 de 6 Transbrasil: corredor tem 26 quilômetros — Foto: Fabio Rossi 6 de 6 BRT TransBrasil — Foto: Editoria Arte

BRT Transbrasil agora funciona de 4h à meia-noite, com intervalos de dez minutos.

Para Clarisse Cunha Linke, diretora-executiva do Instituto de Políticas de Transporte & Desenvolvimento (ITDP Brasil), parte da solução pode vir da integração do BRT Transbrasil com linhas intermunicipais.

— Para que o corredor seja eficiente é necessário que tenha uma integração efetiva com o transporte intermunicipal. Esse é um dos grandes desafios que a gente identifica no momento. Por enquanto há uma ausência do Governo do Estado nesse projeto o que é necessário para que proporcione uma integração operacional, tarifária, de infraestrutura, mas isso infelizmente ainda não está acontecendo. Com essa integração intermunicipal a gente espera que tenha menos ônibus na faixa de tráfego misto o que já ajudaria a melhorar no fluxo — explica Clarice, que considera o BRT um ganho para a cidade — O corredor Transbrasil é um marco para cidade, pode beneficiar até 58% da população aumentando acesso às oportunidades de emprego para pelo menos 23% da população de baixa renda. É um corredor importante estrategicamente para a cidade.

Por meio de nota, a secretaria estadual de Transporte e Mobilidade Urbana informou que tem participado de “reuniões periódicas com a secretaria municipal de Transportes a fim de definir as atribuições e avaliar a oferta de transporte público no corredor Transbrasil, além de discutir os custos para a conclusão das obras” e que “em 2020, o Estado cedeu o terreno para construção do Terminal Deodoro” que ficou à cargo da prefeitura assim como a de “outros terminais, incluindo Margaridas e Missões” que ainda não saíram do papel.

2 de 3 BRT Transbrasil em operação — Foto: Hermes de Paula BRT Transbrasil em operação — Foto: Hermes de Paula

A criação de regras para a circulação de caminhões pela Avenida Brasil também é apontada como medida capaz de aliviar o engarrafamento nas pistas comuns da via. A medida chegou a ser ventilada pela prefeitura e seria implementada em março, mas foi abandonada após reunião com representantes de transportadoras, do setor de logística e caminhoneiros.

— É claro que restrições quanto ao horário de circulação para os caminhões tem um impacto de custo. Então houve uma reação . A questão é que um carro comum, quando enguiça, tem um tempo de resolução muito mais rápido do que o enguiço de um caminhão. Então, não apenas tem muito caminhão circulando, que são veículos de grande porte e ocupam mais espaço, que têm uma outra velocidade (mais lenta), mas além disso quando há um enguiço causa muito dano na faixa de tráfego misto — argumenta Clarisse Linke.

Outra forma de tentar melhorar o trânsito na nova Avenida Brasil seria remanejamento de algumas das linhas de ônibus paradores.

— Acredito que possa ser feito um deslocamento de algumas linhas para bairros adjacentes. Além disso, com o tempo o que vai acontecer é que muitos desses motoristas que estão passando com seus carros vão passar para o BRT e então serão menos carros na via e consequentemente menos engarrafamento, esta é a lógica — diz Ronaldo Balassiano. professor aposentado do Programa de Engenharia de Transportes da Coppe/UFRJ.

Mais uma medida apontada como eficaz para amenizar os congestionamentos seria a supressão faixa seletiva à direita, destinada a ônibus expressos , veículos de serviço e táxis.

— O ideal é fazer o BRT funcionar na faixa dele não obrigatoriamente reservando duas faixas, assim seria possível devolver a outra faixa para o tráfego misto. Logicamente que teria que ser pensada a programação das linhas que funcionariam ali, mas em princípio seria possível conviver os ônibus de linha e os BRTs naquela faixa — aponta José Eugênio Leal, professor emérito da PUC-Rio.

Duas visões

Acostumado a perder mais de duas horas de Ricardo de Albuquerque, onde mora, até a Penha, onde trabalha — ambos bairros da Zona Norte do Rio —, o guia de turismo Caio Rafael de Abreu, de 30 anos, agora só vê o engarrafamento pela janela do BRT Transbrasil. Com o articulado seguindo em pista livre, o passageiro, que saiu do terminal Deodoro às 9h24 cronometrou a viagem, feita em pouco mais de 22 minutos.

3 de 3 O guia de turismo Caio Rafael de Abreu gastou pouco mais de 22 minutos no trajeto até o trabalho — Foto: Geraldo Ribeiro/Agência O Globo O guia de turismo Caio Rafael de Abreu gastou pouco mais de 22 minutos no trajeto até o trabalho — Foto: Geraldo Ribeiro/Agência O Globo

— Agora vai ficar mais fácil até quando tiver que ir para a Zona Sul. Antes eu precisava sair mais cedo de casa. Está muito bem. Engarrafamento agora só pela janela — disse Caio.

Na contramão da alegria de Caio, motoristas dos carros de passeio, caminhões e os passageiros dos ônibus paradores, que não seguem pela pista seletiva tiveram que encarar mais uma segunda-feira de trânsito ruim na Avenida Brasil.

Os trechos mais engarrafados ficavam na altura dos bairros de Irajá, Penha, Cidade Alta e Manguinhos. De acordo com o Centro de Operações Rio (COR), às 7h15, o gráfico de trânsito do Waze apontava congestionamento 15% maior que a média de três semanas, ressaltado que nesse período, houve uma colisão entre caminhão e moto na pista central da via, na altura de Bonsucesso, o que contribuiu para piorar o congestionamento.

Para mostrar a diferença do que enfrentam os passageiros do BRT, que viajam em pista exclusiva para os demais usuários da Avenida Brasil, a reportagem do GLOBO percorreu os 25 quilômetros que separam o terminal Deodoro do TIG, separados por 17 estações e cortando 18 bairros. A viagem feita pelo corredor Transbrasil durou 44 minutos no articulado que saiu de Deodoro às 9h24. De carro, o mesmo itinerário, no mesmo horário, durou 1h20m.

Entre Deodoro e Irajá, a distância de carro foi feita em apenas dez minutos. A partir daí o trânsito começou a ficar lento. Da altura da Ceasa até a entrada da Ilha do Governador piorou ainda mais, principalmente porque os automóveis passaram a disputar espaço na pista com os caminhões.

— A Avenida Brasil está um lixo. Tiraram duas faixas dos motoristas para dar preferência para os passageiros do BRT e deu nisso. Fora da seletiva, além do volume de carros ainda tem os ônibus (paradores) que complicam o trânsito. Está mal planejado — reclama o representante comercial e motorista de aplicativo, Rodrigo Daher Pacheco, de 40 anos, que ontem fez em uma hora o trajeto de Irajá a Benfica.

No início da noite de ontem, o RJTV da TV Globo mostrou que havia lentidão no trânsito entre o Caju e Ramos. Pouco depois das 19h o trânsito já fluía bem na região de Irajá.

Ao GLOBO, a Lamsa, concessionária que administra a Linha Amarela, informou que registrou, ontem, pico de 5 km de congestionamento, no sentido Fundão, no período da manhã, dois quilômetros a mais que o considerado normal para uma segunda-feira.

Responsável pela operação da ponte Rio-Niterói, a Ecoponte disse que “está cedo para analisar o impacto do início da operação do BRT Transbrasil na Ponte Rio-Niterói”. A concessionária “observou o trânsito mais lento na saída para Avenida Brasil ao longo da última semana, principalmente no período da tarde”.

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Elon Musk domina internet por satélite na Amazônia com antenas em 90% das cidades

A Amazônia se tornou o principal mercado no Brasil da Starlink, empresa de internet via satélite do bilionário sul-africano Elon Musk.

Lançada na região em setembro de 2022, a Starlink já é líder isolada entre os provedores de banda larga fixa por satélite na Amazônia legal, com antenas instaladas em 90% municípios da região até julho deste ano, segundo um levantamento exclusivo da BBC News Brasil.

A maior parte destes clientes estão em regiões de difícil acesso na Amazônia, onde não há infraestrutura tradicional de internet de banda larga.

Em maio de 2022, depois de apertar as mãos do então presidente Jair Bolsonaro em um resort de luxo no interior de São Paulo, o empresário disse estar “super animado para o lançamento da Starlink para 19 mil escolas desconectadas em áreas rurais e monitoramento ambiental da Amazônia”.

A promessa não saiu do papel, segundo o ministério da Educação e secretarias estaduais informaram à reportagem.

Mas dados da Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) analisados pela BBC News Brasil em outubro de 2023 revelam que a empresa já tem clientes privados em 697 dos 772 municípios da Amazônia legal (formada por Acre, Amapá, Amazonas, Mato Grosso, Pará, Rondônia, Roraima, Tocantins e parte do Maranhão).

A Starlink possibilita avanços importantes, como a possibilidade de uso de cartões de crédito e débito e Pix em cidades que não tinham internet de alta velocidade. Mas a expansão da tecnologia de Musk também impulsiona atividades ilegais, apontam autoridades brasileiras à BBC News Brasil.

“O Ibama informa que se tornou recorrente encontrar antenas Starlink nos garimpos”, afirmou o órgão à reportagem.

Imagens obtidas com exclusividade pela BBC mostram antenas da empresa de Musk junto a armas, munição e ouro recolhidos em operações da Polícia Federal e do Ibama.

O domínio da empresa na conexão de regiões isoladas levanta questões sobre segurança e soberania nacional, segundo especialistas brasileiros e estrangeiros ouvidos pela reportagem, especialmente depois da controvérsia recente sobre a dependência ucraniana de antenas da Starlink na guerra contra o Exército russo (veja mais abaixo).

Entre todos os 124 municípios que formam a faixa de fronteira da Amazônia legal com outros países, segundo o levantamento feito pela reportagem, apenas um não possuía antenas Starlink até o mês de julho.

Procurada diversas vezes, a empresa liderada por Elon Musk não respondeu a pedidos de comentários da BBC News Brasil sobre sua rápida expansão no Brasil, a promessa de internet em escolas, e o uso de sua tecnologia para atividades criminosas na floresta.

Soberania nacional

A Starlink revolucionou o mercado ao lançar uma enorme constelação de satélites que orbita o planeta em baixa altitude, tornando a velocidade de conexão entre os satélites e o solo mais rápida.

Mais de 5 mil satélites Starlink já foram lançados no espaço, disse à BBC News Brasil a Celestrak, laboratório norte-americano que monitora satélites.

Este enorme conjunto permite à empresa de Elon Musk levar conexão de qualidade à internet a lugares remotos e distantes, onde não há infraestrutura local como cabos e postes — caso de boa parte da Amazônia.

Mas isso pode colocar decisões importantes sobre países e governos nas mãos do empresário.

A Starlink virou alvo de debates sobre segurança de dados no mundo todo no início de setembro, quando Elon Musk admitiu não ter permitido que o governo da Ucrânia tivesse acesso à rede Starlink para evitar relação com o que definiu como um “grande ato de guerra”.

“Se tivesse concordado com o pedido, a SpaceX (empresa que envia os satélites usados pela Starlink para o espaço) seria explicitamente cúmplice de um grande ato de guerra e escalada de conflitos”, disse Musk, que foi criticado por autoridades ucranianas.

À BBC News Brasil, o professor T.S. Kelso, ex-chefe do Instituto de Tecnologia e da Divisão de Análise Espacial do Comando Espacial da Força Aérea dos Estados Unidos, disse que o debate sobre soberania nacional é “especialmente significativo”.

“Sistemas de comunicação são frequentemente mantidos sob controle governamental por vários motivos, da prevenção de comportamentos ilícitos à supressão de dissidências”, ele diz.

“É de vital importância para a segurança nacional, por exemplo, para a Defesa, ter sistemas de comunicação seguros e confiáveis. Permitir que qualquer empresa – ou indivíduo – decida unilateralmente estas questões parece ter sérias implicações para a segurança nacional”, continua.

O especialista em antropologia da tecnologia David Nemer, professor da Universidade da Virginia (EUA), concorda.

“Quando a gente fala de internet, não está falando só de Twitter ou Facebook. Falamos de serviços vitais para o funcionamento de uma cidade. Dar esse poder à Starlink é muito preocupante”, avalia.

O Ministério da Defesa disse à reportagem que não se posicionaria sobre o tema.

Garimpo

Ouro, armas, munição pesada e antenas Starlink viraram “o novo normal” em apreensões de forças de segurança brasileiras em áreas de garimpo ilegal, segundo um porta-voz do Ibama informou à BBC News Brasil.

De acordo com o órgão, do início do ano até o dia 4 de setembro, 32 termos de apreensão de antenas foram realizados em operações de combate ao garimpo ilegal.

Só na última grande operação contra garimpeiros em terras indígenas no rio Tapajós (PA), cinco antenas Starlink foram apreendidas ou destruídas.

“Em geral as antenas são colocadas nos acampamentos e nas dragas de garimpo”, disse o órgão.

O acesso à internet de alta velocidade facilitou o trabalho de garimpeiros e traficantes de madeira e drogas da região, afirmam especialistas.

Até a chegada da empresa, o principal meio que eles tinham em locais isolados para se comunicarem sobre a chegada de carregamentos ou operações de repressão da Polícia Federal era o rádio.

“Agora eles fazem tudo por WhatsApp”, diz um funcionário da Polícia Federal que pediu anonimato.

Para o professor Nemer, da Universidade da Virginia, o uso das antenas em garimpos “não é uma surpresa”.

“Um dos argumentos com os quais Elon Musk tenta promover a Starlink é o de levar a internet para onde a internet jamais chegou. Mas estes são lugares precarizados, onde as pessoas não têm meios para comprar e manter uma conexão de internet por satélite, que ainda é extremamente cara”, diz.

“Essa propaganda sobre inclusão digital é uma falácia, um mito. Quem de fato pode bancar esses serviços são pessoas com algum poder financeiro (…) Então não me surpreende que essas essas antenas tenham caído nas mãos de garimpeiros, já que eles têm condição de pagar.”

O valor inicial da mensalidade Starlink no Brasil é de R$ 185 reais. O kit de instalação custa a partir de R$ 1.400 — mas revendedores chegam a cobrar até R$ 5 mil pela antena em locais remotos da Amazônia em grupos de garimpeiros.

Transformação em comunidades isoladas

A tecnologia, ao mesmo tempo, trouxe transformações positivas a cidades e comunidades distantes dos grandes centros.

Em janeiro, indígenas yanomami instalaram uma antena Starlink que agora permite a comunicação em alta velocidade entre profissionais de postos de saúde e familiares de doentes em comunidades isoladas da Terra Indígena.

“Nossa internet está funcionando perfeitamente”, disse à BBC News Brasil Junior Yanomami, presidente da associação yanomami Urihi.

“Tem ajudado de forma excepcional, tanto para equipe de saúde, que diariamente repassa informações e solicitações de resgate, como para os yanomami, que nos comunicam sobre tudo que acontece na região em que está instalada a internet”, completa o líder indígena.

Em cidades em Roraima e no Acre, moradores finalmente podem usar cartões de débito ou crédito — e até mesmo fazer pagamentos via Pix —, graças à estabilidade e velocidade da conexão à internet via Starlink.

“Eu passei dez dias com o pessoal yawanawá lá no Acre e foi uma experiência muito interessante. A internet (Starlink) é uma coisa nova no território deles (…) e facilitou muito essa comunicação entre as aldeias”, afirma David Nemer.

“Eles fazem trocas e estão o tempo todo lidando com o ‘homem branco’ nas cidades. Eles têm conta bancária, e é mais fácil realizar transações bancárias. A internet facilita muito a venda de artesanatos. (…) É algo que eles ainda estão explorando e investigando, então é um pouquinho cedo pra ver o que, de fato, a longo prazo, isso pode trazer para o território.”

Controvérsia sobre escolas

Elon Musk usou sua conta pessoal no Twitter para anunciar “o lançamento da Starlink para 19 mil escolas desconectadas” na Amazônia em maio de 2022, meses antes do início das atividades da empresa na região Norte do país.

Mais de um ano depois, a BBC News Brasil consultou o ministério da Educação, e secretarias de educação de todos os Estados que formam a Amazônia legal sobre o andamento do programa.

“Verificamos junto à área de Tecnologia e Inovação da Educação Básica que não existe parceria formal, no âmbito do Ministério da Educação (MEC), com a Starlink”, informou o órgão federal.

A secretaria de Educação e Desporto de Roraima informou que “até a presente data, nenhuma escola da rede estadual de ensino possui internet via Starlink”.

O governo do Pará disse que “o referido anúncio de parceria entre o governo passado e a Starlink não beneficiou as escolas paraenses” e que está preparando uma licitação própria para expandir a digitalização escolar.

O governo do Tocantins afirmou que “escolas públicas do Estado não receberam nenhum sinal de internet via Starlink.”

A secretaria do Maranhão informou “que não tem parceria com a empresa”.

Os governos de Amazonas, Amapá, Rondônia, Mato Grosso e Acre não responderam à reportagem.

*Esta reportagem foi publicada originalmente em outubro de 2023 e atualizada em 8 de abril de 2024.

Visão do Correio: Jogo de soma zero prejudica a Petrobras

Não importa quem tem razão na disputa entre o presidente da Petrobras, Jean Paul Prates, e o ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira. A discussão sobre a gestão dos dividendos da empresa no contexto de uma disputa de poder entre facções políticas, como está se apresentando, é um jogo de soma zero. Ou seja, os interesses dos jogadores são opostos, e não cooperativos, suas perdas e danos são individuais, mas afetam direta e negativamente o valor de mercado da empresa.

A crise entre ambos deu lugar a uma disputa de poder entre o PSD, aliado do governo, e o PT, que pretende se aproveitar das divergências para emplacar no comando da Petrobras o atual presidente do BNDES, Aloizio Mercadante. Será mais um contraponto ao ministro da Fazenda, Fernando Haddad, que sofre permanente “fogo amigo” dos petistas. Assim, terá repercussão geral no ambiente econômico e na credibilidade do governo junto aos investidores.

A polêmica entre Silveira e Prates pôs na ordem do dia, da pior forma possível, a troca de comando da empresa. A última reunião do atual Conselho de Administração será no próximo dia 19; assembleia geral para eleição dos novos conselheiros, em 25 de abril. Mesmo que Prates seja mantido no cargo, substituir Pietro Mendes, presidente do Conselho de Administração da Petrobras e aliado de Silveira, pelo ex-senador Aloizio Mercadante, economista desenvolvimentista, mostra a intenção de um grau de interferência política do PT na gestão da empresa que contraria as boas regras de gestão corporativa.

Há precedentes de erros estratégicos cometidos na gestão da Petrobras durante os governos do PT, que levam desconfiança ao mercado. Não se trata apenas do escândalo da Petrobras, mas também de uma concepção de expansão das atividades da empresa para setores que não são diretamente ligados à atividade-fim, a produção de energia. É o caso da Sete Brasil, empresa criada para fabricar sondas de exploração do pré-sal, que foi a joia da coroa do chamado “Petrolão” e causou enormes prejuízos à empresa.

Silveira também foi protagonista da crise provocada pela fracassada tentativa de emplacar o ex-ministro da Fazenda Guido Mantega no comando da Vale. Embora possa agradar ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva, sua atuação no “enquadramento”de estatais de sua pasta denota uma tendência de intervenção política na gestão da empresa. O Brasil tem uma cultura avessa à gestão de ativos públicos por critérios de excelência e meritocracia.

A gestão de ativos públicos pode impulsionar ou prejudicar o crescimento econômico. Muitos países sofrem com a falta de investimentos em infraestrutura porque gerenciam mal os seus ativos. Está provado que a democracia tem mais chances de atuar em prol do interesse comunitário quando os governantes se preocupam mais com os consumidores e entregam esses ativos à administração profissional e, para isso, lançam mão do que existe de melhor na gestão corporativa.

Um novo fracasso na gestão da Petrobras, como o que ocorreu nos governos petistas anteriores, pode arrastar a imagem do presidente Lula ladeira abaixo e resultar, mais à frente, na privatização integral da empresa. Não faltam exemplos de privatizações bem-sucedidas para a oposição construir uma narrativa com esse objetivo.

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